O Estudo do Ensinamento Autêntico
Ajuda o Despertar da Percepção Direta
 
 
Carlos Cardoso Aveline
 
 
 
 
 
Com frequência é difícil para o estudante de filosofia esotérica perceber de modo cabal um  fato básico: o fato de que o conhecimento filosófico não está nas palavras, e não é transmitido por elas. [1]
 
O conhecimento precisa ser transmitido ou alcançado de alguma outra maneira, contando apenas com a ajuda, e não mais do que a ajuda, do ensinamento escrito. Eu mesmo demorei bastante a perceber as implicações desse princípio central.
 
Quando identifiquei – entre 1999 e 2002 – o profundo fosso que separa o ensinamento autêntico de teosofia das fantasias pseudoesotéricas produzidas no período entre 1892 e 1933, pensei ingenuamente que o estudo racional, sincero, do ensinamento autêntico iria gerar uma ação teosófica eficiente. Mais tarde, convivendo já com estudantes de Helena Blavatsky de diferentes países, compreendi pouco a pouco que o estudo de ensinamentos autênticos não é garantia de coisa alguma. Há outro problema além de ensinamentos falsos: o hábito do pensamento superficial, por parte dos estudantes.
 
Os itens mais importantes, no aprendizado verdadeiro, são a intenção correta, a busca independente, e a transmissão direta. O ensinamento autêntico é um instrumento precioso, mas ainda assim é um instrumento.
 
O estudante necessita de três refúgios. Primeiro, o refúgio no Mestre, isto é, na sabedoria presente em sua própria alma espiritual. Segundo, o refúgio no ensinamento autêntico, com discernimento para rejeitar os ensinamentos falsos, porque nem tudo que reluz é ouro. E finalmente, o refúgio em uma comunidade de buscadores honestos (sejam eles muitos ou poucos) e que compartilham o mesmo ensinamento e o mesmo projeto pedagógico.
 
Se uma organização relativamente forte no plano material publica todas as obras de Helena Blavatsky, mas faz isso como uma curiosidade intelectual ou para obter prestígio, ou mesmo com a melhor das intenções, e as oferece ao lado das numerosas formas de fantasias pseudoespirituais que existem hoje, não ocorre de fato uma divulgação da verdadeira teosofia, embora os textos sejam autênticos. O que acontece neste caso é uma degradação dos textos autênticos, tratados como meras coleções de palavras e separados de qualquer esforço orgânico de aprendizagem vivencial.
 
As palavras corretas e autênticas são então lidas do mesmo modo como uma criança de sete anos – cujo objetivo sincero é jogar futebol no pátio – escuta a leitura de uma obra de Shakespeare, ou um profundo e complexo conto de Dostoievsky.
 
O carma do estudo depende do ponto de vista desde o qual se olha o ensinamento. A motivação que permite compreender Blavatsky é fazer o bem à humanidade e a todos os seres. A boa vontade altruísta, consciente, deve estar no centro da alma do peregrino.
 
Um mestre de sabedoria escreveu:
 
“Só aquele que tem amor à humanidade em seu coração, que é capaz de compreender completamente a ideia de uma Fraternidade prática e regeneradora, tem o direito à posse dos nossos segredos. Só ele, um homem assim – jamais fará mau uso de seus poderes, e não haverá receio algum de que os dirija para fins egoístas. Um homem que não coloca o bem da humanidade acima do seu próprio bem não é digno de se tornar nosso chela – não é digno de elevar-se em conhecimento mais do que o seu vizinho.” [2]
 
Qual é a motivação do papagaio erudito, que nada sabe da teosofia da alma? Ele deseja ser um iluminado. Ele busca alcançar a glória espiritual e ser mais sábio do que os outros.
 
Mas ali onde a ética, o autossacrifício e a boa vontade não estão presentes, a teosofia não pode estar presente – mesmo que os estudantes recitem de memória, página a página, tudo o que Helena Blavatsky escreveu.
 
O conhecimento das palavras pode dar a alguém um intenso prestígio superficial, e o seu uso talvez torne uma instituição burocrática mais forte. Mas teosofia é outra coisa.
 
O conhecimento verdadeiro é inseparável do desapego, da audácia e da humildade. Seu alicerce é o autoesquecimento, apoiado pela prática da renúncia e da perseverança no mais elevado. O conhecimento da sabedoria é sempre oculto, silencioso, externamente invisível. Poucos o percebem, mas é graças a ele que, gradualmente, o estudante se liberta da sua própria ignorância.
 
NOTAS:
 
[1] Veja a Carta 20 em “Cartas dos Mahatmas”, Editora Teosófica, Brasília, volume I, especialmente pp. 134-135. A tradição Zen e o Taoísmo também deixam claro o caráter em grande parte não-verbal da sabedoria e do ensinamento.
 
[2] Carta 33 em “Cartas dos Mahatmas”, Ed. Teosófica, Brasília, volume I, página 173. Na edição em inglês, p. 252.
 
000
 
O artigo “O Conhecimento Está Além das Palavras” foi publicado nos websites associados em 15 de fevereiro de 2023.
 
000
 
A respeito do primeiro dos três refúgios citados no texto acima, o refúgio na fonte do ensinamento, examine o artigo “Como Encontrar o Mestre”.
 
000
 
Leia mais:
 
 
 
 
000
 
 
Helena Blavatsky (foto) escreveu estas palavras: “Antes de desejar, faça por merecer”. 
 
000