Como Alimentar uma Ideia Para
Que Ela Se Expresse no Plano da Ação
 
 
Jean des Vignes Rouges
 
 
 
A imagem de JVR (1879-1970) é reprodução de um quadro de
Landowski (conforme a revista Masques & Visages, França, Edição de Agosto
a Outubro de 1970, p. 12). À direita, o seu livro “Dictionnaire de la Volonté”, 1945.
 
 
 
Em grande número de casos, o ato de querer consiste muito simplesmente em instalar uma ideia no centro da consciência e esperar pela sua realização automática.
 
Com efeito, conforme foi estabelecido de uma maneira indubitável pela psicologia contemporânea, a “representação mental”, isto é, a imagem, a ideia, o pensamento, é já uma fase da ação. Vemos um grão de poeira na manga do nosso casaco, e esta imagem desencadeia imediatamente o movimento que afasta o detrito inconveniente. 
 
Não reproduzirei aqui as experiências e raciocínios que estabeleceram esta ação “ideomotora”. Basta que você lembre da seguinte verdade: “a ideia inclina à ação”, para usar a fórmula que Antonin Eymieu desenvolveu com precisão e clareza nos seus belos livros sobre a educação da vontade. Você não pode evocar uma ideia, uma palavra, sem que haja, em todo o seu corpo, vibrações imperceptíveis que iniciam o ato ao qual essa ideia, ou essa palavra, está associada.
 
Nestas condições entendemos que a ideia, bem instalada na nossa consciência, mantida com firmeza, consegue despertar automaticamente os atos que lhe correspondem, sempre que o nosso organismo esteja preparado para realizá-los, porque também acontece que ao combinar ideias e atos nós podemos querer coisas que vão além das nossas possibilidades materiais. É por isso que não é suficiente ter a ideia de ir até a Lua para realmente se projetar no espaço em direção a este astro celeste.
 
Como você instala uma ideia em sua consciência? Prestando atenção a ela. Como se pode fixar a atenção? Alimentando a atenção com uma ideia que lhe interessa de modo espontâneo e imediato; ou então propondo à atenção uma ideia que será um meio para atingir um objetivo atraente, porém mais distante.
 
É esse segundo processo que você está aplicando neste momento, enquanto lê este livro [1]. Você talvez o considerasse tedioso, se não tivesse o desejo de cultivar a sua vontade; mas ele cativa a sua atenção (atrevo-me a pensar) porque por baixo das frases às vezes desagradáveis que o convido a ler, você espera encontrar o caminho para melhorar a si mesmo.
 
Pois bem, esse é o mecanismo da atenção que você deve colocar em movimento a cada instante, para querer. É necessário que você invente o interesse que o forçará a prestar atenção. Quando você sai da cama, o seu dia começa. De repente aparece em sua mente a ideia de uma tarefa a ser realizada durante o dia, e a ideia está com uma cara suja e sombria. O seu primeiro movimento é descartar essa imagem desagradável. “Não quero pensar nisso!”, diz você. Mas isto é covardia! Se esta tarefa desagradável é realmente útil, se ela adaptará você melhor à vida, você deve, pelo contrário, evitar que a ideia da tarefa escape da sua consciência. A situação exige um ato de atenção da sua parte.
 
Se você for corajoso, você se forçará a repetir: “Preciso fazer essa tarefa desagradável!” Este já é um bom movimento. Mas não basta, porque se a ideia do trabalho penoso mantiver no seu rosto uma expressão lúgubre, a atenção rapidamente se cansará de olhar para o trabalho. Depois de alguns momentos, as suas exortações mentais se tornarão mecânicas e de repente você perceberá que sua atenção se esvaiu; ela já flerta com ideias mais agradáveis.
 
Para concentrar a atenção, lave bem esta imagem desagradável de trabalho cansativo. Examine a tarefa com mais atenção, esforçando-se por descobrir nela atrações insuspeitadas. Você conseguirá isso com bastante facilidade, se chamar para ajudá-lo todos os interesses que estão em jogo nas circunstâncias. Eles são numerosos. Alguns ficam ameaçados pelo não-cumprimento da tarefa, outros, ficarão felizes com sua conclusão. Eles se apresentam e reclamam os seus direitos. Essa é a imagem que permanece. Se você conseguir que ela crie raízes, tudo está salvo. A ideia de trabalho penoso, que você aceitou como num casamento por interesses, então se torna uma esposa perfeita. Ela limpará a casa sem reclamar e fará você feliz. Em outras palavras, esta ideia produzirá automaticamente os seus efeitos motores, simplesmente porque você conseguiu encantá-la e mantê-la no centro de sua consciência.
 
É possível treinar a sua atenção? Sim. Isso acontece acostumando-se a prever as consequências das ideias que você deseja fixar na sua consciência. Na prática, basta se questionar sobre a ideia que deseja estabelecer dentro de si. As perguntas forçam a imaginação a servir a atenção.
 
Então, cada vez que uma “ideia feliz” – daquelas que deveriam crescer em você – entra na sua consciência, tente segurá-la, acariciá-la, para que não desapareça.
 
Quem realizará este agradável trabalho? A sua imaginação! É a função dela. Para fazê-la esforçar-se nisso, incomode-a fazendo perguntas. Por exemplo, estas. Se esta “ideia feliz” se concretizar, o que verei, o que ouvirei, o que irei cheirar e tocar? O que vou comer e beber? Insista para que a sua imaginação mostre a você da forma mais concreta possível, nas brumas do futuro, uma pessoa que esfrega as mãos de satisfação, que ri, que está de parabéns, e muito feliz. Esse personagem é você.
 
Ah! Como essas imagens estimulam e cativam a sua atenção! Quantos acordes sensíveis vibram dentro de você! Já não há necessidade de ficar tenso para lembrar a “ideia feliz”. Está aí, magnificamente instalada na sua consciência. Dezenas de outras ideias secundárias se colocam a serviço dela. Basta você deixá-las à vontade. Você “quer” realizar a “ideia feliz” sem qualquer questionamento. Sua atenção foi suficiente para tudo.
 
Então você agora entende que, se tivesse treinado sua atenção para se concentrar em interesses secundários e distantes, seria capaz de realizar sem resistência muitas ações que de outro modo são rejeitadas. É por isso que você aprenderá com prazer a geometria, o manejo de uma ferramenta de carpintaria, o manejo do arado, a limpeza das panelas; porque a sua atenção, ao realizar estas operações, estará fixada na ideia do agrimensor feliz, do carpinteiro eficiente, do bom lavrador ou do cozinheiro famoso, que um dia você será.
 
No entanto, conforme afirma o grande psicólogo norte-americano William James, principal teórico da vontade adquirida pela fixação da atenção, há casos em que a ideia mantida na consciência é tão desagradável que a atenção, mesmo sendo chicoteada de todas as maneiras, se recusa a absorvê-la, e até, tenta vomitá-la. Neste caso, então, o esforço se impõe como necessário. A ideia que aterroriza ou paralisa a imaginação deve ser mantida em nossa consciência a todo custo. O dever é, então, caminhar na direção da maior resistência. Onde encontrar forças para concordar, apesar de tudo, com a presença destas representações mentais assustadoras? É o mistério do “fiat” – a aceitação silenciosa da nossa vontade, o fortalecimento das fibras do nosso coração, que nos faz dizer diante do dever mais austero, mais doloroso, e mais perigoso: “Sim, quero que seja exatamente deste modo!”
                                                          
Nisso vemos, mais uma vez, que a vontade surge das profundezas secretas da nossa personalidade, das suas forças misteriosas que impulsionam a mecânica do nosso corpo e, enfim, da nossa alma.
 
NOTA:
 
[1] “Dictionnaire de la Volonté”, Paris, 1945. Vários textos desta obra estão disponíveis nos websites da Loja Independente de Teosofistas. Clique no nome do autor para vê-los: Jean des Vignes Rouges.
 
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O artigo “A Atenção e a Vontade” foi publicado nos websites da Loja Independente de Teosofistas no dia 14 de maio de 2024.
 
Trata-se de uma tradução do texto «L’Attention et la Volonté», que faz parte da obra «Dictionnaire de la Volonté», de Jean des Vignes Rouges: Éditions J. Oliven, Paris, 320 pp., 1945, ver pp. 33 a 35. Carlos Cardoso Aveline fez a tradução.
 
Jean des Vignes Rouges é o pseudônimo literário do militar e escritor francês Jean Taboureau (1879-1970).
 
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