Pomba Mundo
 
Como Fazer de Fato o Bem que Queremos
Fazer, e Evitar os Erros Que Não Desejamos
 
 
Carlos Cardoso Aveline
 
 
O Dilema Ético de S. Paulo
 
Medir e avaliar  são tarefas indispensáveis  no momento de tomar uma decisão
 
 
 
A arte de agir corretamente ensina a plantar o bom carma que desejamos colher. Para isso, nem sempre a boa vontade é suficiente, porque o caminho para a sabedoria é estreito e íngreme, e um agudo discernimento é indispensável. 
 
Um aspecto central dos desafios a enfrentar é mencionado por São Paulo em Romanos, 7: 18-19: 
 
“Não faço o bem que quero fazer, mas faço o mal que não quero  fazer.”
 
O carma da paz e da bem-aventurança não vem por acaso. Ele deve ser preparado e construído a cada momento, durante muito tempo. Será necessário identificar a cada instante o que é verdadeiro e o que é falso.  Porém, a capacidade de enxergar com clareza só vem pouco a pouco, à medida que tentamos constantemente o melhor, sem deixar-nos influenciar pelo aparente fracasso.  Devemos usar o nosso melhor critério – mesmo  que ele seja  imperfeito – e fazer  isso  durante o tempo  necessário. Aprenderemos com os erros. O discernimento se desenvolverá talvez lentamente e entre um fracasso e outro, mas de modo seguro.
 
Será indispensável praticar a renúncia e a moderação. O  “Dhammapada” budista afirma:
 
“Aquele que se entrega a distrações inconvenientes, e não a uma reflexão adequada, renuncia a seu próprio bem-estar. Procurando prazeres, ele inveja o homem que se dedica à meditação. Não se apegue ao agradável, nem ao desagradável. Ver o agradável implica ver o desagradável – ambos são  dolorosos. Portanto não seja atraído para coisa alguma. A perda de um objeto amado é dolorosa, mas não há prisão para aquele que não gosta nem desgosta. Do apego surge o sofrimento. Do apego surge o medo. Não há sofrimento para aquele que está livre do apego.” [1]
 
Os desejos desregulados provocam uma luta entre o querer consciente  e o querer subconsciente. O comportamento médio resulta da luta ou da cooperação que existe entre os vários níveis de consciência.
  
Grande parte da ação é involuntária e subconsciente, e o dilema ético de São Paulo pode ser formulado assim: 
 
“Não faço o bem que quero conscientemente fazer; mas cometo o erro que subconscientemente  desejo fazer.”
 
Como as ações  humanas nunca são totalmente voluntárias, o autoconhecimento, a purificação interior e a higiene mental são indispensáveis. O conhecimento de si mesmo permite ver e avaliar com clareza as situações da vida.
 
Em seu diálogo “Protágoras”, Platão escreve:
 
“Suponha que a felicidade consiste em fazer e escolher o que é grande; e em não fazer, ou evitar, aquilo que é menor. Qual seria o princípio da salvação da vida humana? A arte de medir não seria o princípio da salvação? Ou seria o poder das aparências? Esse último não é aquela arte enganadora que nos faz oscilar para cima e para baixo, e optar, em um momento, por coisas das quais nos arrependeremos depois, tanto em nossas ações como ao escolher entre coisas grandes e pequenas? A arte de medir deixa de lado a força das aparências, e, ao mostrar a verdade, ensina de bom grado à alma como encontrar descanso na verdade, e assim salva nossa vida. Será que a humanidade não reconhece, em geral, que a arte que produz esse resultado é a arte de medir?  (…..)” [2]
 
“Medição” é, na verdade, “discernimento”, ou “Viveka” em sânscrito. 
 
Platão prossegue:
 
“… Vendo que a salvação da vida humana é reconhecida como algo que consiste na escolha correta de prazeres e dores, na escolha do que é mais e do que é menos, do grande e do pequeno, e do próximo e do longínquo, será que essa medição não é a avaliação do que há em excesso ou que falta, e da igualdade na relação entre um e outro?”
 
O lema do movimento teosófico afirma que “não há religião mais elevada que a verdade”. Platão, por sua vez,  ensina que não existe coisa alguma mais poderosa que o conhecimento da verdade. Ele escreveu:
 
“… Nós dois estávamos concordando em que não há nada mais poderoso que o conhecimento, e que o conhecimento, onde quer que esteja, é vantajoso em relação ao prazer e a  todas as outras coisas…”
 
O diálogo platônico prossegue:
 
“…  Você (…) admitiu que os homens erram em suas escolhas de prazeres e sofrimentos; isto é, na sua escolha entre bem e mal; e erram por falta de conhecimento; e você admitiu mais, que eles erram, não só por falta de conhecimento em geral, mas por falta daquele tipo específico de conhecimento que se chama medição.”
 
As pessoas erram ao avaliar as situações.
 
Descrever o discernimento como uma medição é usar uma imagem geométrica para definir a capacidade de diferenciar o que é certo e errado, ou “grande” e “pequeno”.
 
Para Platão, a divindade suprema – a lei do carma e do equilíbrio –  é “o grande  geômetra do universo”. O mundo é regulado pela lei da harmonia.  Do ponto de vista do ser humano,  a primeira coisa a ser “medida” é o seu próprio ser.  E, de fato, um ditado popular brasileiro afirma:
 
“Tudo vale a pena quando a alma não é pequena.” 
 
O Dhammapada assegura:
 
“Se renunciando a um prazer de pequeno valor é possível obter um contentamento valioso, o homem sábio renunciará ao prazer de pequeno valor para garantir o contentamento profundo.” [3] 
 
O desafio é saber medir.
 
Platão afirma:  
 
“ … Ninguém busca voluntariamente o mal, ou aquilo que considera  ser o mal. Preferir o mal ao bem não faz parte da natureza humana; e quando um homem é forçado a escolher entre dois males, ele nunca escolhe o maior, se puder escolher o menor.”
 
O filósofo grego ensina que o medo e a falta de autocontrole estão entre as causas dos erros que se comete ao tentar medir as situações. A sabedoria, por outro lado, dá ao  ser humano um sentido correto de justiça e de equilíbrio, e permite que ele enxergue as oportunidades para o bem que a  vida coloca a todo momento diante de si.                                 
 
NOTAS:
 
[1] “O Dhammapada”,  edição online de nossos websites associados, capítulo 16.
 
[2] “Protagoras”, de Platão,  no volume “Plato”, Great Books of the Western World, The Encyclopaedia Britannica,  Chicago, London, Toronto, 1952,  814 pp.  Ver pp. 60-64, e especialmente 61-62.  
 
[3] “O Dhammapada” obra citada,  capítulo 21.
 
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