Pomba Mundo
 
Helena Petrovna Blavatsky,
Henry S. Olcott e William Q. Judge   
 
 
Boris de Zirkoff
 
 
os-fundadores-do-movimento-teosofico
 
Boris de Zirkoff (1902-1981)
 
 
 
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Nota Editorial:
 
Boris de Zirkoff (1902-1981) foi o compilador
dos Escritos Reunidos (“Collected Writings”) de
Helena P. Blavatsky, em 15 volumes.  Essa vasta
coleção não inclui os livros publicados em vida por 
H.P.B., e limita-se a seus artigos e textos menores.
Embora publicados pela Theosophical Publishing 
House, de Adyar, os “Collected Writings” 
resultaram  de um esforço combinado de teosofistas
de várias agrupações, realizado ao longo de várias 
décadas sob a coordenação de Boris de Zirkoff.  
No texto a seguir,  o pensador Zirkoff  estabelece 
com farta documentação que William Judge
(1851-1896) é um dos três principais  fundadores
do movimento. Judge cumpriu um  papel central  nas
duas primeiras décadas do trabalho teosófico pela
fraternidade universal,  e mais especialmente após 1885.  
 
O artigo foi traduzido da revista “Theosophy”, de
Los Angeles, edição de julho de 1961, pp. 417-422. 
Título original: “William Quan Judge – a Founder”.
Para comodidade do leitor, as  notas de rodapé de 
Boris de Zirkoff estão colocadas aqui entre colchetes, 
em itálico, no próprio texto, e vão sublinhadas. 
 
(Carlos Cardoso Aveline)
 
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Há muitos anos tem sido costume em alguns círculos teosóficos de várias partes do mundo desconsiderar o papel desempenhado por William Quan Judge na  formação da Sociedade Teosófica, e frequentemente desqualificar sua personalidade e sua  influência na fase inicial da história do movimento.
 
As razões para esta atitude são de certa forma confusas, mas há escassas dúvidas de que elas surgem das idiossincrasias pessoais dos membros, e da ignorância que prevalece entre eles sobre a história do seu próprio movimento.
 
Entre as ideias curiosas que tiveram permissão para circular e crescer ao longo dos anos está uma que  tem sido expressada mais de uma vez tanto oralmente quanto por escrito, segundo a qual o sr. Judge dificilmente poderia ser considerado um dos fundadores da Sociedade, e H. P. Blavatsky e o Cel. Henry S. Olcott são na verdade os únicos que se pode chamar de cofundadores.
 
Podemos simplesmente ignorar tais afirmativas,  quando elas surgem de fontes irresponsáveis,  interessadas, talvez, em obter seus próprios objetivos não confessados. Mas quando a afirmativa é feita por pessoas de vasta erudição e de posição de destaque no movimento, é importante que a ideia seja corrigida com base nos fatos existentes.
 
Mesmo uma esplêndida teosofista, de mente nobre, como Josephine Ransom, recentemente falecida, parece haver ficado desorientada em relação a esta questão, no seu valioso livro “A Short History of the Theosophical Society” [ Theosophical Publishing House, Adyar, Índia, 1938/1989, p. 78]. Ali, depois de um breve esboço da formação da Sociedade em 1875, ela diz:
 
“O coronel Olcott mais tarde reservou a palavra ‘fundadores’ para aqueles que trabalharam intensamente e com autossacrifício, ao longo dos anos, para estabelecer os alicerces da Sociedade, e descreveu como ‘anteriores’ (às vezes chamados de ‘instituidores’ por H.P.B.), aqueles que deram os seus nomes nesta reunião, mas que por uma ou outra razão deixaram de estar ativos, ou renunciaram. Só H.P.B. e o Cel. Olcott permaneceram até o fim. Judge, depois de anos de um ótimo trabalho, separou-se da Sociedade um ano antes de morrer em 1896: portanto, o título de ‘Fundadores’ normalmente se refere apenas a H. P. Blavatsky e H. S. Olcott – que, com o tempo, passou a ser chamado de presidente-fundador (…).”
 
Deixando de lado o assunto da chamada “separação”, que não necessita ser discutida aqui, a curiosa afirmação acima dá a impressão de que Judge não trabalhou “intensamente e com autossacrifício” na medida suficiente para ser chamado de Fundador, algo que teria sido desmentido pelo próprio Cel. Olcott, a julgar por várias afirmações feitas por ele sobre este mesmo tema. Além de ser injusta em relação a Judge, a afirmação é injusta em relação ao próprio Cel. Olcott. Impressa, como foi, em uma obra promovida oficialmente pela Sociedade Teosófica (Adyar), ela tem muito mais peso do que pronunciamentos casuais feitos por pessoas que pouco sabem do assunto.
 
Vejamos agora as evidências.
 
Escrevendo ao sr. Judge de Ostende, em 27 de Julho de 1886, em um momento em que ela estava adoentada e sem saber do futuro, H.P.B. aborda a revista de Judge, The Path, e diz:
 
“… Vou trabalhar a partir de hoje para fazer com que Olcott destine 50 por mês para a sua Path. Esses recursos devem ser encontrados – porque se somos três da origem que permanecemos até hoje, em seguida seremos dois…” [ De uma carta não publicada de H.P.B.]
 
Em uma carta dela ao sr. Judge, datada do mesmo lugar no dia 22 de Agosto de 1886, H.P.B. afirma, sem meias palavras:
 
“… E você, você é um dos fundadores originais…” [ Publicada originalmente em “The Theosophical Forum”, Point Loma, Califórnia, Vol. V, novembro 1933]  
 
A importante Carta de H.P.B. à Segunda Convenção Anual da Seção Norte-Americana da Sociedade Teosófica, realizada em Chicago, em 22 e 23 de abril de 1888, foi endereçada a William Q. Judge, e nela H.P.B. se dirige a ele da seguinte maneira: “Meu Querido Irmão e Cofundador da Sociedade Teosófica”. [“Relatório de Procedimentos”. Essa Carta foi publicada muitas vezes.] A carta é assinada com os três pontos que simbolizam o status oculto de H.P.B., e deve, portanto, ser considerada um documento oficial.
 
Quando “The Theosophist” publicou o Relatório oficial daquela Convenção, acrescentou alguns dados sobre W.Q. Judge, que atuou como seu presidente e secretário. O autor do relatório afirmou:
 
“… Ele é um dos fundadores da Sociedade Teosófica, e esteve presente na reunião pública na sala de visitas da residência da sra. Blavatsky, quando foi levantada pelo Cel. Olcott a ideia de formar a Sociedade, e ele propôs a escolha do sr. Olcott como seu presidente temporário…” [“The Theosophist”, volume IX, julho 1888, pp. 620-621. ]
 
Escrevendo a Richard Harte desde Londres, em 12 de setembro de 1889, H.P.B. opôs-se fortemente a certa orientação seguida naquele momento nas páginas de “The Theosophist”, e especialmente pelo próprio R. Harte, e expressou-se do seguinte modo:
 
“… Não permitirei que Judge seja rebaixado ou humilhado nisso. Judge é um dos fundadores e um homem que sempre tem sido leal aos Mestres…” [ Publicado originalmente em “The Theosophical Forum”, Point Loma, Califórnia, Vol. V, 15 de janeiro de 1934, pp. 132-133. ]
 
Nas suas “Explicações Preliminares” à Instrução Número III da E.E., escrita por H.P.B. durante uma grave crise enfrentada pelo movimento em 1889-1890 devido a traições internas e violentos ataques externos, especialmente na América do Norte, ela se expressa corajosamente e afirma em relação a W.Q. Judge:
 
“… Ele é um dos três fundadores da Sociedade Teosófica, os únicos três que permaneceram firmes como uma rocha em sua lealdade à Causa …”   
 
Referindo-se em data posterior à sua decidida defesa de Judge nas páginas do documento citado acima, ela disse em uma carta:
 
“… Que eles leiam a carta do Mestre na … preliminar. Tudo o que eu disse sobre W.Q.J. foi a partir das Suas palavras em Sua carta para mim……” [ “Letters That Have Helped Me”, Vol. II, p . 117 ]
 
Em dezembro de 1889, Richard Harte, informando sobre assuntos teosóficos na América do Norte, escreve em “The Theosophist” sobre o processo de consolidação que está ocorrendo lá sob a liderança de Judge. Ele diz:
 
“… Essa é uma boa notícia, porque o sr. Judge é um teosofista antigo e firme, e é sempre reconhecido e tratado pela sra. Blavatsky e pelo Cel. Olcott como ‘um dos fundadores’ ….” [ “The Theosophist”, Vol. IX, Suplemento de dezembro, 1889, p. XLII ]
 
Um mês depois da morte de H.P.B., a revista dela, “Lucifer” [1], publicou uma declaração datada de Londres, 19 de maio de 1891, para desmentir certas afirmações caluniosas de alguns jornais. Este documento estava assinado por dez trabalhadores de destaque no Movimento na Inglaterra, e o nome da sra. Annie Besant encabeçava a lista. Entre outras coisas, o documento afirmava:
 
“… Em conjunto com o Cel. H. S. Olcott, presidente da Sociedade, e o sr. William Q. Judge, destacado advogado em Nova Iorque, vice-presidente e líder do movimento na América do Norte, a sra. Blavatsky foi a fundadora da Sociedade Teosófica, e esta é uma posição que não pode ser cancelada por um ‘golpe de estado’ nem de qualquer outra maneira …” [ “Lucifer”, Vol. VIII, junho de 1891, pp. 319-320. ]
 
Informando sobre a morte de H.P.B. e a chegada de vários dirigentes em Londres, “The Theosophist” publicou uma carta recebida de Londres que descrevia os acontecimentos na Sociedade e a reação da imprensa à morte de H.P.B. O redator dá atenção à chegada da sra. Annie Besant e de W.Q. Judge, e diz:
 
“… O sr. Judge permanecerá na Inglaterra até a chegada do Cel. Olcott no início de julho; sua presença conosco em um momento tão triste é muito bem-vinda, porque todos os que tiverem o privilégio de conhecer o vice-presidente e cofundador da Sociedade Teosófica compreenderão em seguida como nós devemos valorizar o sentimento de força, coragem e esperança, com que ele inspira qualquer pessoa com quem ele esteja, em qualquer lugar.” [ “The Theosophist”, Adyar, Vol. XII, julho de 1891, p. 634. ]
 
Depois da sua chegada em Londres, o Cel. H. S. Olcott dirigiu a Primeira Convenção Anual da Sociedade Teosófica na Europa, realizada naquela cidade nos dias 9 e 10 de julho de 1891. Em seu discurso presidencial, ele contou que havia sabido da morte de H.P.B. enquanto estava em Sydney, Austrália, e que havia alterado seus planos e viajado quase imediatamente para a Europa. Ele disse:
 
“… Decidi imediatamente alterar meus planos e vir para cá, e solicitei por telégrafo ao meu antigo colega e cofundador, o sr. Judge, que me encontrasse aqui e que fizesse consultas com outros colegas sobre o futuro da Sociedade …” [ “The Theosophist”, Adyar, setembro de 1891, p. 707. ]
 
Essa afirmativa deve ser pelo menos suficiente para estabelecer, de uma vez por todas, qual é a opinião do próprio Cel. Olcott sobre se o sr. Judge era um “fundador”.
 
Em 7 de outubro de 1891, o Cel. Olcott estava em San Francisco, no seu caminho de volta para a Índia. O sr. Judge também estava lá, no meio de uma programação através dos Estados Unidos, a serviço do movimento. Na recepção dada ao presidente-fundador, o sr. Judge estava, naturalmente, presente. Pouco antes da abertura da reunião, o Cel. Olcott disse a ele: “Sente-se ao meu lado agora, como você sentou-se em Nova Iorque em 1875:  nós estávamos no trabalho naquele momento,  e também estamos  agora”. [ “The Path”, Nova Iorque, Vol. VI, novembro de 1891, p. 260.]
 
Informando sobre a mesma viagem ao Oeste do Cel. Olcott e do sr. Judge, Allen Griffiths, um dos mais incansáveis trabalhadores na América do Norte, descreve o encontro dos dois dirigentes em Oakland. Ele escreve:
 
“Ali estava uma visão capaz de alegrar os corações de todos os verdadeiros teosofistas – o presidente e o vice-presidente, os dois fundadores ainda vivos da S.T., reunidos nestas praias distantes do Pacífico, apertando-se as mãos e saudando um ao outro como irmãos unidos por um elo incomum.” [ Revista “Lucifer”, Vol. IX, novembro de 1891, p. 259.]
 
Já vimos agora que tanto H.P.B. como o Cel. H.S. Olcott não tinham dúvidas de que Judge era um cofundador da Sociedade com eles, e podemos supor que eles conheciam esta questão melhor do que ninguém.
 
Mas se mais alguma prova for desejada, pode ser útil e interessante, do ponto de vista histórico, reproduzir o texto completo de uma Circular publicada em forma impressa para os membros da Loja Blavatsky, em 11 de março de 1892, e assinada por Annie Besant, como presidente daquela Loja. A ocasião era a anunciada renúncia do Cel. Olcott como presidente da S.T., uma renúncia que ele mais tarde retirou. A Circular é a seguinte:
 
“Aos Membros da Loja Blavatsky. 19, Avenue Road, Regent’s Park, London, N.W., 11 de março de 1892.
 
“Meus caros colegas, 
 
“Pela primeira vez na história da Sociedade Teosófica, somos chamados a escolher um presidente. Quando a Sociedade foi fundada em 1875 por H.P. Blavatsky, H.S. Olcott e William Q. Judge, H.S. Olcott foi escolhido presidente, e ele ocupou esta posição até o ano atual. Agora o cargo está vago, devido à sua renúncia, e cabe a nós preenchê-lo.
 
“Tendo em vista a importância que tem para toda a Sociedade a escolha correta do nosso principal dirigente, sinto que vocês bem podem esperar de mim, como presidente desta loja, que expresse alguma opinião, não para decidir quais serão os seus votos, mas como um fator na formação do seu julgamento. Portanto eu digo francamente a vocês que, no meu entendimento, o atual vice-presidente, e um cofundador da Sociedade que permanece ativo, William Quan Judge, é a pessoa mais adequada para guiar a Sociedade, e é alguém que não se poderia deixar de lado sem cometer uma injustiça. Ele não é apenas um vice-presidente e um fundador, mas é também um amigo e colega de H.P.B. que mereceu a confiança dela desde 1875 até a sua morte. Embora pertencendo por nascimento a um país antigo, ele ganhou a confiança da Seção Americana devido ao seu trabalho fiel, e sem dúvida terá o apoio unânime daquela Seção.
 
“Tendo assim colocado minhas percepções a serviço da Loja, deixo a questão em suas mãos. 
 
“Fraternalmente,
 
“Annie Besant,
 
“Presidente da Loja Blavatsky.”
 
Diante deste conjunto de dados históricos, qualquer incerteza em relação ao status de W.Q. Judge na estrutura da Sociedade Teosófica original se torna completamente desnecessária, e qualquer relutância em reconhecer os fatos tal como são, ou qualquer receio de colocá-los sob a luz correta na perspectiva histórica são, não só inúteis, mas também prejudiciais à causa da Verdade e da justiça.
 
No dia em que todos os que fazem parte das organizações teosóficas ativas no mundo tiverem colocado o nome de William Quan Judge ao lado dos nomes de H. P. Blavatsky e do Cel. Henry S. Olcott como os principais fundadores da Sociedade Teosófica nos seus documentos oficiais e papéis timbrados, um grande passo terá sido dado pela causa da unificação, da boa vontade e da solidariedade teosóficas em todo o mundo.
 
Já é hora de que este passo seja dado, como um ato de simples justiça. Ele é exigido não só pelos fatos históricos, mas sobretudo pelo nosso sentido de justiça, de sinceridade, e por nossa exatidão inquestionável, como estudantes de Teosofia cuja meta deve ser em todos os momentos um estrito respeito à Verdade, sejam quais forem as consequências, e uma disposição expressa de dar crédito ao que merece crédito. É melhor fazer isso como uma medida voluntária, que surge de um sentimento de justiça, do que ver isso abrir caminho à força até nós, devido à lógica irresistível dos acontecimentos históricos, e ao trabalho sutil da justiça cármica.
 
Seguindo o exemplo da nossa primeira e mais destacada líder, H.P.B., nós solicitamos, “para um passado espoliado, o crédito das suas realizações que vem sendo negado já por um tempo excessivamente longo”; e chamamos “por uma devolução de mantos que foram tomados por empréstimo, e o resgate de reputações que foram caluniadas, mas são gloriosas.”
 
NOTA:
 
[1] A palavra “Lúcifer”, mal interpretada pelo cristianismo medieval e supersticioso, significa “portador da luz”, e, tradicionalmente, era usada para designar o planeta Vênus. (CCA)
 
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Em setembro de 2016, depois de cuidadosa análise da situação do movimento esotérico internacional, um grupo de estudantes decidiu formar a Loja Independente de Teosofistas, que tem como uma das suas prioridades a construção de um futuro melhor nas diversas dimensões da vida.
 
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