O Movimento Teosófico
Deve Abrir Espaço Para o Futuro
Deve Abrir Espaço Para o Futuro
Carlos Cardoso Aveline
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Esse texto foi publicado inicialmente sob o
título “The Coming of the New Cycle” na
revista eletrônica “The Aquarian Theosophist”,
edição do mês de novembro de 2005, pp. 01-07.
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Ao longo do século 21, os estudantes da filosofia esotérica podem se perguntar qual é a sua responsabilidade em relação ao conjunto do carma humano.
De certo modo, eles são guardiães de uma sabedoria tão antiga quanto moderna. No entanto, eles não devem estudar a Sabedoria somente para seu próprio benefício. Se o fizerem, seu fracasso será desde o começo inevitável.
Para entender o espírito da sabedoria sagrada, o objetivo do estudante deve ser beneficiar a humanidade. E mesmo isso não é suficiente: Helena P. Blavatsky ensinou que o conhecimento filosófico também deve ser um processo vivo e criativo, constantemente aplicado e testado na nossa vida cotidiana. Não se alcança a sabedoria repetindo sempre as mesmas ideias contidas nos livros sagrados.
Mas, se tivermos algum grau de verdadeiro altruísmo e de vontade de agir a partir desse sentimento, pode ser, então, que nos confrontemos com uma questão bastante desconfortável:
“À medida que nossa civilização se confronta com perigos grandes e crescentes de vários tipos, de que forma devemos nos sentir responsáveis por seu futuro? Qual é a nossa responsabilidade real?”
Responder a essa questão não é tarefa simples. Há, porém, pelo menos uma coisa sobre a qual podemos ter certeza: estamos rodeados de crises e oportunidades.
A cada noite, elas estão nos noticiários de televisão. Elas são apresentadas em nossos jornais e programas de TV favoritos. Por toda a África, Europa, Ásia e Américas, inundações, incêndios florestais, secas, furacões e outros eventos semelhantes parecem promover uma mudança climática global que pode ter efeitos drásticos sobre o destino da nossa civilização. Essas centenas de eventos climáticos são mostradas na mídia como se fossem fatos isolados que acontecem nesse momento apenas por alguma estranha coincidência.
Isso, porém, não é verdade. Também não é por coincidência que os sinais de decadência ética e social da nossa civilização – incluindo crime organizado, corrupção na política, miséria, guerras e ataques terroristas – ocorrem ao mesmo tempo que o desmatamento, a poluição ambiental e as mudanças climáticas. A verdade é que espírito e matéria evoluem juntos: ao longo da História, cada vez que a ganância do homem o fez destruir seu ambiente natural, ele mesmo acabou pagando caro por isso.
Ao escrever em 1879 sobre os efeitos do desmatamento na Índia, por exemplo, H. P. Blavatsky disse:
“Uma rápida olhada nas páginas da História já mostra que a ruína e a extinção definitiva do poder nacional se segue à extirpação das florestas, tão certo como a noite segue o dia. A natureza providenciou os meios para o desenvolvimento humano, e suas leis nunca podem ser violadas sem desastre.” [1]
Os ecologistas e aqueles que estudam a filosofia esotérica sabem que tudo no planeta se inter-relaciona.
Por outro lado, também vemos que ter acesso à informação não é o mesmo que ter conhecimento. A diferença entre conhecimento e informação é que o conhecimento leva à ação correta, mas a mera informação, não.
Assim, para responder à pergunta sobre a nossa responsabilidade em relação ao destino da civilização atual, nós teremos que começar por examinar um questionamento prévio e também desconfortável:
“Quanto conhecimento direto temos sobre filosofia esotérica?”
A importância disso é que só o conhecimento direto provoca um sentimento duradouro de responsabilidade, livre de vaidade ou messianismo.
Uma percepção exata das coisas, sentida profundamente, produz um senso de ética e uma intenção ativa de ser útil. Talvez tenha sido para ressaltar o significado desse sentimento de responsabilidade pessoal que Thomas Taylor, o filósofo neoplatônico, escreveu há alguns séculos:
“Um pouco de conhecimento é uma coisa perigosa.
Beba muito, ou então não prove da fonte PLATÔNICA;
Nela, pequenos goles intoxicam o cérebro,
E beber profundamente nos faz sóbrios de novo.” [2]
A responsabilidade que emerge do conhecimento profundo nos torna sóbrios de novo – porque ela nos leva para a ação, externa e interna.
Quando os estudantes têm um sentido de responsabilidade natural e espontânea em função daquilo que estão aprendendo, então surge o momento certo para um número crescente deles começar a pensar, de forma calma e tranquila, sobre duas questões:
1) Para a filosofia esotérica, o tempo é circular, ou cíclico. Ele avança em espiral. Como podemos avaliar o atual momento de nossa civilização, do ponto de vista dessa doutrina dos ciclos ou eras?
2) Qual é a relação entre o surgimento de um novo ciclo do tempo humano e as crescentes dificuldades enfrentadas por tantos países nesta primeira parte do século 21?
Talvez possamos obter apenas alguns fragmentos da resposta – mas isso não é, em absoluto, razão para desistir. Investigar pacientemente o assunto e compartilhar nossos esforços pode ser útil tanto para a causa do bem da humanidade como para nós mesmos. Cada aspirante à verdade deve começar pelos fragmentos que estão ao seu alcance. Cedo ou tarde a intuição e o bom senso podem ajudá-lo a preencher os espaços em branco. À medida que o tempo passa, o Carma e aqueles que sabem mais do que nós tendem a facilitar nossa tarefa de vários modos visíveis ou invisíveis.
Ao investigar a doutrina dos ciclos, relacionando-a ao momento atual da história da humanidade, há algo que devemos lembrar desde o início. É inútil tentar estabelecer o momento exato em que esse ou aquele “grande evento” deverá acontecer. As mudanças dos ciclos de tempo, ou eras, não ocorrem de acordo com a nossa noção de tempo superficial. No texto de HPB, Conversations on Occultism (Conversações Sobre Ocultismo), um estudante pergunta:
“Será correto inquirir sobre os períodos em que os ciclos mudam, e especular sobre mudanças, astrológicas ou outras, que anunciam uma queda?”
E um sábio responde:
“Não. Há um antigo ditado que diz que os deuses têm ciúmes dessas coisas, não desejando que os mortais as saibam. Nós podemos analisar a era, mas é melhor não tentar fixar a hora de uma mudança de ciclo. Além disso, você não será capaz de determiná-la porque um ciclo não começa em um certo dia ou ano de um outro ciclo, eles se sobrepõem, de modo que embora a roda de um período ainda esteja girando, o momento inicial do outro já começou.” [3]
Quanto à chegada do novo ciclo, iniciada no final do século 19, há um parágrafo bem conhecido, escrito por um discípulo conforme o ditado de um Mestre de Sabedoria:
“Nós estamos no final de um ciclo – geológico e de outras dimensões – e no começo de outro ciclo. Cataclismo seguirá cataclismo. As forças acumuladas estão explodindo em muitos locais; e os homens não serão apenas engolidos ou mortos aos milhares; ‘novas’ terras aparecerão e ‘velhas’ submergirão, erupções vulcânicas e ondas gigantescas causarão medo; mas segredos de um passado insuspeito serão revelados, para assombro dos teóricos ocidentais e humilhação de uma ciência arrogante. Essa nau à deriva, se observada, pode parecer encalhar nos vestígios emergentes de antigas civilizações, e se despedaçar. Não ambicionamos as honras dos profetas: ainda assim, que isso fique como uma profecia.” [4]
Cataclismo seguirá cataclismo, disse a profecia em 1883. Já que sabemos que o ciclo novo e o ciclo velho se misturam e convivem muito tempo durante a transição, podemos deduzir facilmente que essa profecia não se referia apenas a algumas décadas. Vejamos, então – do ponto de vista dos melhores levantamentos científicos disponíveis atualmente – qual é a avaliação científica feita, em 2005, a respeito dos acontecimentos geológicos e climáticos que ocorreram nos últimos 100 anos, aproximadamente. Isso servirá para ilustrar o fato de que, apesar de todos os obstáculos, a filosofia esotérica deve manter um diálogo vivo com a ciência e os cientistas.
Como escreveu um dos Mahatmas: “A ciência moderna é o nosso melhor aliado.” [5] A ciência convencional frequentemente despreza a sabedoria esotérica; mesmo assim, a palavra do Mestre permanece verdadeira.
O mundialmente respeitado WorldWatch Institute, em Washington, costuma estudar os acontecimentos do mundo atual à luz da sustentabilidade ecológica e da ética social. Na edição de Janeiro/Fevereiro de 2005, o Instituto publicou um artigo chamado Repensando a Segurança – um Papel Diferente Para os Militares. Escrito por Gregory D. Foster – professor na Universidade Nacional de Defesa em Washington e importante especialista militar dos EUA – o texto compara dois dos principais problemas que, no momento, confrontam nossa civilização: o terrorismo e a crise ambiental.
O professor Foster diz que a maioria dos governos costuma subestimar a importância das questões ecológicas. E explica:
“Que as questões ambientais preocupem tão pouco o público em geral é um reflexo do quão limitado e pouco estratégico é, na realidade, o nosso pensamento sobre segurança. (…) Vejam, por exemplo, a comparação entre o número de mortes causadas pela ameaça terrorista, que dispõe de alta credibilidade, e a ameaça dos desastres naturais, que merece pouco crédito. Desde 1968, ocorreram 19.114 incidentes terroristas em todo o mundo, resultando num total de 23.961 mortes e 62.502 ferimentos associados. Por mais perturbadores que possam ser esses dados, eles perdem força quando comparados aos dos desastres naturais.”
Gregory Foster prossegue:
“A média anual de mortes no decorrer do século passado, devido a seca, fome, enchentes, vendavais, extremos de temperatura e incêndios florestais, foi de 243.577. Assim, mesmo ignorando terremotos, erupções vulcânicas e epidemias, e não contando os ferimentos e demais prejuízos (tais como ficar desabrigado), três vezes mais pessoas morrem a cada ano, em média, em desastres naturais que poderiam estar relacionados – e exacerbados – pela mudança climática, do que as que foram mortas ou feridas, ao todo, em 37 anos de incidentes terroristas. E, se a média de todo um século parece indesejável, temos que, considerando apenas o período a partir de 1990, já ocorreram mais de 207.000 mortes causadas por esses desastres apenas no sul da Ásia; mais de 23.000 na América Central e México, e dezenas de milhares em outras partes do mundo.” [6]
Assim, a profecia escrita em 1883 é confirmada pelos fatos, se a compararmos com os dados provenientes das melhores fontes científicas disponíveis atualmente.
O artigo do professor Foster na revista “Worldwatch” não é um fato isolado.
Um ano antes, Sir David King, conselheiro-chefe para assuntos científicos do então primeiro-ministro britânico Tony Blair, escreveu um artigo publicado na edição de 4 de janeiro de 2004 da revista Science, dizendo que a mudança climática era “o problema mais grave que estamos enfrentando hoje – mais grave até do que a ameaça terrorista”. Sir David King disse que o governo dos EUA estava fracassando em enfrentar o desafio do aquecimento global”. [7]
Em fevereiro de 2004 as revistas “The Observer”, na Inglaterra, e “Fortune”, nos EUA, revelaram algumas das principais conclusões de um relatório científico feito pelo Pentágono para o presidente George W. Bush. A revista brasileira “CartaCapital” dedicou reportagem de capa ao assunto.[8] O relatório antevia a possibilidade de uma desordem ecológica, geológica, econômica, social e militar de âmbito mundial, entre 2010 e 2015, com sérios problemas começando a partir de 2007.
Vale a pena registrar que o bem conhecido filme “O Dia Depois de Amanhã” (“The Day After Tomorrow”) está baseado em algumas das principais hipóteses que ecologistas e cientistas têm adotado recentemente.
Fatos são fatos: cientistas e especialistas de ponta estão tendo que aceitar uma realidade óbvia. Os padrões e ritmos climáticos têm ficado mais e mais imprevisíveis ao redor do mundo. Em dezembro de 2004 vimos o tsunami asiático causar milhares de vítimas em vários países. Todo o planeta foi levemente sacudido por aquele acontecimento, sugerindo que eventos maiores desse tipo podem mudar a posição do eixo planetário, um evento cíclico discutido na obra de H.P. Blavatsky “A Doutrina Secreta”.
Em agosto de 2005 o furacão Katrina matou muitas pessoas e causou grande devastação nos EUA. Vulcões entram em atividade, secas e enchentes se espalham, e milhares de eventos menos espetaculares acontecem todos os dias, com custos econômicos e sociais imensos.
O Brasil não é exceção. Vale a pena registrar um fato entre muitos: em meados de 2006, a seca atingia vários estados nas regiões sul e sudeste do país. No dia 21 de agosto, em Ribeirão Preto, em SP, a umidade relativa do ar caiu para 4,8 por cento, quebrando o recorde nacional de todos os tempos desde que há medições. No mesmo dia, a umidade relativa do ar no deserto do Sahara, no norte da África, foi de 10 por cento. [9]
Será que a desregulação climática tem relação com a mudança de ciclo na evolução humana? Sim: podemos estar razoavelmente seguros a respeito disso. Os eventos futuros mais importantes frequentemente lançam sua sombra sobre o presente, e um Mestre de Sabedoria escreveu:
“A aproximação de cada novo ‘obscurecimento’ é sempre assinalada por cataclismos – de fogo ou de água.” [10]
Fica claro, agora, que as forças “acumuladas” às quais a profecia de 1883 se referiu não estão apenas “explodindo por todos os lados”. Elas estão também acelerando o ritmo com que eclodem. O fato de estarmos enfrentando tantos eventos diferentes no mundo externo – todos ocorrendo ao mesmo tempo – nos faz pensar sobre a relação entre a aceleração de tais acontecimentos e a mudança de ciclo na história humana.
Podemos nos lembrar de uma carta de um Mestre, em que ele usa a expressão antropológica-esotérica “sub-raça”, termo que significa “uma sucessão de civilizações ao longo de milhares de anos”. Disse o sábio, na década de 1880:
“Menos de dois séculos antes da chegada de Cortez houve uma grande ‘aceleração’ em direção ao progresso entre as sub-raças do Peru e México, assim como há hoje na Europa e nos E.U.A. A sub-raça deles terminou em quase total aniquilação devido a causas geradas por ela própria ; o mesmo ocorrerá com a sua, ao final desse ciclo.” [11]
Menos de dois séculos, de fato. Estaria o Mestre sugerindo que um ciclo seria concluído “menos de dois séculos” depois dos anos 1880, quando sua carta foi escrita?
No mesmo texto, esse místico dos Himalaias acrescentou – usando a palavra “raça” no seu sentido esotérico/espiritual de uma longa série de civilizações, cujos cidadãos podem ter diferentes características físicas:
“… Assim, havendo atingido o ápice do seu desenvolvimento e glória, a quarta Raça, dos atlantes, foi destruída por água; você encontra hoje apenas seus remanescentes decadentes e caídos, cujas sub-raças, no entanto – ah, cada uma delas teve seus dias prósperos, gloriosos e de relativa grandeza. O que elas são agora – vocês serão algum dia, porque a lei dos ciclos é única e imutável. Quando a sua raça – a quinta – houver alcançado o seu zênite de intelectualidade física, e desenvolvido a civilização mais elevada (…), incapaz de elevar-se em mais nada em seu próprio ciclo, seu avanço em direção ao mal absoluto será interrompido (como seus antecessores, os lemurianos e atlantes, foram interrompidos em sua marcha no mesmo rumo) por uma destas mudanças cataclísmicas; sua grande civilização será destruída (…).” [12]
No parágrafo acima, é útil meditar especialmente sobre essas palavras:
“… Seu avanço em direção ao mal absoluto será interrompido (…..) por uma destas mudanças cataclísmicas …”
De fato, os acontecimentos internos e externos estão fortemente conectados, e não podem ser separados.
As crises ética, social e geológica de nosso tempo são todas parte de um mesmo processo. Os ciclos cósmicos e geológicos estão ligados de modo direto às marés subjetivas que sobem e descem dentro das almas dos seres vivos.
William Q. Judge escreveu:
“Em relação aos grandes cataclismos que ocorrem no início e no fim dos grandes ciclos, as principais leis que governam os seus efeitos são as leis do Carma e da Reencarnação, que atuam de acordo com a regra cíclica. Não é apenas o homem que é governado por essas leis, mas também cada átomo de matéria e o conjunto da matéria estão constantemente passando por mudanças ao mesmo tempo que o homem.” [13]
A Bíblia cristã registra esse fato em vários trechos, inclusive em Deuteronômio, capítulos 27 e 28; no primeiro livro de Reis, capítulo 8; e em Isaías, capítulos 10 e 29. O antigo Wen-tzu taoísta estabelece a mesma ligação direta entre a evolução da alma e os processos geológicos. [14]
Nessa relação entre os processos da alma e os processos geológicos, sabemos que os fatos da consciência, que são sutis, têm mais influência do que os fatos materiais e densos. “O Universo é governado de dentro para fora”, segundo afirmou o famoso cientista do século 20 Fred Hoyle, um físico, em seu livro “O Universo Inteligente”.
Assim, ao examinar o destino dos globos planetários [e o mesmo vale para civilizações], Judge diz:
“Nós não admitimos que o fim de uma força está na retirada por parte de um Deus de sua proteção, nem no súbito impulso dado por ele a uma outra força contra o globo, mas que a força em ação e que determina o grande ciclo é a mesma força do homem, considerado como ser espiritual; quando ele terminou de usar o globo , ele o deixa (…).”[15]
A ideia se aplica também a civilizações porque, como se sabe, aquilo que é válido para os ciclos mais longos vale, também, para os ciclos menores.
Então podemos ver que os altos e baixos das marés cíclicas da ética, da justiça e da solidariedade na alma coletiva da humanidade exercem uma influência decisiva no destino das civilizações.
E isso torna-se muito claro quando vemos a Profecia Purânica, registrada por H.P.Blavatsky nas páginas de “A Doutrina Secreta”:
“Haverá monarcas contemporâneos reinando sobre a terra, reis de espírito mau e caráter violento, devotados à mentira e à perversidade. Farão matar mulheres, crianças e vacas; apoderar-se-ão dos bens dos seus súditos , e cobiçarão as mulheres dos outros; terão um poder ilimitado, suas vidas serão curtas, seus desejos insaciáveis. (…) Apenas a propriedade material definirá a posição social; a riqueza será a única coisa capaz de inspirar devoção; a paixão será o único elo de união entre os sexos; a falsidade será o único meio de sucesso nos conflitos, e as mulheres serão meros objetos de gratificação sensual… até que a raça humana se aproxime de sua aniquilação (pralaya) ….. Quando o fim da era de Kali estiver próximo, uma porção daquele ser divino que existe, de sua própria natureza espiritual…. deverá descer à terra… (Kalki avatar) (…..) Ele restabelecerá a justiça sobre a terra e as mentes daqueles que viverem no final do Kali Yuga serão despertadas e se tornarão translúcidas como o cristal.”
Novamente, não há motivo para pensar que essas palavras se referem unicamente a algum futuro distante, já que sabemos que grandes ciclos são antecipados por ciclos menores. Logo abaixo dessa transcrição da profecia purânica, H.P.B. escreveu, ironicamente:
“Certa ou errada a profecia acima, as ‘bençãos’ do Kali Yuga são bem descritas e se casam admiravelmente com o que vemos e ouvimos na Europa e em outras terras civilizadas e cristãs, em pleno século XIX e alvorecer do XX, a respeito da nossa grande era ILUMINADA”. [16]
Como sabemos que os eventos externos (físicos) e internos (da alma) estão sempre ligados, fica mais fácil entender certos aspectos da responsabilidade cármica e ética que pertence aos estudantes de filosofia esotérica, com relação ao destino de nossa atual civilização.
H.P.B. não se recusou a escrever sobre isso. Em pelo menos dois textos, ela reconheceu a existência de uma ligação direta entre o nível de lealdade à Verdade, no movimento esotérico e nos seres humanos de boa vontade, e o destino da nossa civilização.
No artigo “Our Cycle and the Next” (“Nosso Ciclo e o Próximo”) , H.P.Blavatsky cita uma profecia otimista atribuída ao escritor francês Victor Hugo. O autor de “Os Miseráveis” escreveu:
“O século dezesseis será conhecido como a era dos pintores, o dezessete será nomeado a era dos escritores, o dezoito a era dos filósofos, o dezenove a era dos apóstolos e profetas. (….) No século vinte, a guerra estará morta, o cadafalso estará morto, a animosidade estará morta, mas o homem viverá. Para todos haverá um único país – e esse país será a terra inteira; para todos haverá apenas uma esperança – e essa esperança todo o paraíso.”
Logo abaixo dessa citação, H.P.B. refere-se ao elo oculto que liga o destino da nossa civilização à Sabedoria Esotérica (um de cujos muitos nomes é ‘Teosofia’). Ela escreveu:
“Se a Teosofia, prevalecendo na luta, lançar as raízes profundas de sua filosofia toda abrangente nos corações e mentes dos homens, se suas doutrinas da Reencarnação e do Carma, em outras palavras, da Esperança e Responsabilidade, encontrar abrigo nas vidas das próximas gerações, então, de fato, uma época de alegria e contentamento nascerá para todos aqueles que agora estão desprezados e sofrendo. Porque a verdadeira Teosofia é ALTRUÍSMO, e isso tem suprema importância. É o amor fraternal, ajuda mútua, devoção inabalável à Verdade. Se de uma vez por todas os homens se conscientizarem de que apenas assim pode-se encontrar a felicidade, e nunca na riqueza, em posses ou gratificações egoístas, então as nuvens negras serão dissipadas e uma nova humanidade nascerá sobre a terra. Então de fato terá início a Idade do Ouro. Mas se não for assim, a tempestade explodirá e nossa alardeada civilização e sua cultura afundarão num mar de tamanho horror como jamais se registrou.” [17]
“A Chave Para a Teosofia” é um outro livro em que H.P.B. liga o futuro da civilização ao trabalho do movimento esotérico ou “teosófico”. Ela escreve, no parágrafo final do livro, que se o movimento cumprisse sua missão, a Terra seria um paraíso no século 21, se comparada com o que ela era no século dezenove. [18]
Menos de dois séculos se passaram desde que essas palavras foram escritas.
Surgiram no movimento esotérico inúmeras divisões. Multiplicaram-se falsos clarividentes, ritualismos, crenças e dogmas religiosos em um movimento que deveria ser filosófico e buscar livremente a verdade que está além das formas e instituições. Perdeu-se grande parte da perspectiva geral e ampla trazida por HPB. Alguns progressos foram feitos.
Embora ainda pouco visível, permanece no mundo, na primeira parte do século 21, um núcleo de lealdade sincera e ativa à Verdade Universal e ao altruísmo – isso é, à Sabedoria Divina livre de rótulos externos.
Esse núcleo está espalhado por vários países e línguas. De um ponto de vista profundo, esse é um grupo de almas, e não de personalidades físicas.
Muitos dessas pessoas sequer ouviram falar sobre Mestres de Sabedoria, Teosofia ou Helena Blavatsky. Muitos tampouco participam da Universidade da Paz, da organização Brahma Kumaris, do movimento Boa Vontade Mundial (Escola Arcana) ou de outros movimentos universalistas. Mas suas mentes estão sinceramente voltadas para o bem da humanidade, em uma perspectiva capaz de transcender esta ou aquela religião, e portanto participam, em escala maior ou menor, do esforço do Novo Ciclo.
Alguns buscadores da verdade estudam filosofia esotérica, meditam, refletem e buscam o autoaperfeiçoamento de modo regular e diário, enquanto expandem sua consciência individual como cidadãos planetários.
Cada um faz o que lhe parece adequado a cada momento. O mais importante, para a filosofia esotérica, é a existência de um Território Sutil de Veracidade, Sabedoria e Compaixão; ou seja, uma massa acumulada de pensamentos e sentimentos universalmente fraternos, que é alimentada por pessoas de boa vontade.
Esse “território” subjetivo vive dentro do campo magnético maior que é o carma coletivo da humanidade; e ele abre caminho para o próximo passo evolutivo da caminhada comum.
Grande ou pequeno, o guarda-chuva de fraternidade incondicional já está aberto sob um céu que promete tempestades.
Esse guarda-chuva de sabedoria planetária é um fator construtivo central no processo que define o destino da civilização humana agora e nas próximas décadas.
NOTAS:
[1] “The Theosophist”, Adyar, India, Volume I, November 1879, p. 42.
[2] “ The Theosophist”, Adyar, India, Volume II, December 1880, p. 52.
[3] “H. P. Blavatsky Collected Writings”, TPH, India-USA, Volume IX (1888), TPH, USA, 1986, p. 101.
[4] Esse trecho pertence ao parágrafo final do texto intitulado “Sakya Muni’s Place in History”, publicado pela primeira vez no século 19. Veja “Five Years of Theosophy”, The Theosophy Co., Los Angeles, 1980, p. 388. Também aparece em “Collected Writings” de HPB, TPH, volume V, p. 259. Quanto ao autor da profecia, H.P.B. escreveu em uma carta particular ao sr. Sinnett que um Mestre “ordenou a Subba Row que respondesse sua objeção sobre a data de nascimento do Buda e as fantasiosas datas de Cunningham” (Veja “Letters of H. P. Blavatsky to A.P. Sinnett”, T.U.P., Pasadena, CA, facsimile edition, 1973, Letter XXIII, p. 46.) O sr. Subba Row escreveu as ideias do mestre, e isso inclui a profecia.
[5] “Cartas dos Mahatmas para A. P. Sinnett”, Editora Teosófica, Brasília, 2001, edição em dois volumes, ver volume I, Carta 65, p. 268.
[6] “WorldWatch magazine”, Worldwatch Institute, Washington, vol. 18, no. 1, January/February 2005, p. 43. Todo o artigo é muito útil para uma avaliação teosófica do atual momento da humanidade.
[7] Citado pelo professor Foster em “Worldwatch magazine”, January/February 2005, p. 38.
[8] “CartaCapital”, edição semanal de 03 de março de 2004. Ver também a revista “Wordwatch”, do “Wordwatch Institute”, Washington, May/June 2004, p. 9.
[9] “Folha de S. Paulo”, SP, 22 Agosto 2006, Capa e página C6.
[10] “Cartas dos Mahatmas para A. P. Sinnett”, Editora Teosófica, Brasília, 2001, edição em dois volumes, ver volume II, Carta 93B, p. 120.
[11] “Cartas dos Mahatmas para A. P. Sinnett”, Editora Teosófica, Brasília, 2001, edição em dois volumes, ver volume II, Carta 93B, p. 110.
[12] “Cartas dos Mahatmas para A. P. Sinnett”, obra citada, volume II, Carta 93B, p. 120.
[13] “The Ocean of Theosophy”, William Judge, Theosophy Co., Los Angeles, 1987, veja p. 123.
[14] Ver os capítulos 15, 19, 136 e 178 de “Wen-tzu, a Compreensão dos Mistérios, Ensinamentos de Lao-Tzu” , Ed. Teosófica, Brasília, 198 pp. A obra tem 180 capítulos breves.
[15] “The Ocean of Theosophy”, William Judge, obra citada, p. 118.
[16] “The Secret Doctrine”, H. P. Blavatsky, The Theosophy Co., Los Angeles, 1982, volume I, pp. 377-378.
[17] “H. P. Blavatsky Collected Writings”, Volume XI (1889), TPH, India-USA, 1973, p. 202.
[18] “A Chave Para a Teosofia”, H.P. Blavatsky, Editora Teosófica, Brasília, 1991, 262 pp., ver p. 261.
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Sobre o mistério do despertar individual para a sabedoria do universo, leia a edição luso-brasileira de “Luz no Caminho”, de M. C.
Com tradução, prólogo e notas de Carlos Cardoso Aveline, a obra tem sete capítulos, 85 páginas, e foi publicada em 2014 por “The Aquarian Theosophist”.
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