Oito Trechos das Cartas dos
Mahatmas, Para Refletir e Meditar
Mahatmas, Para Refletir e Meditar
Carlos Cardoso Aveline (Ed.)
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Os trechos a seguir são reproduzidos da
coletânea “Cartas dos Mahatmas Para A. P.
Sinnett” (Ed. Teosófica, Brasília, 2001, dois
volumes). Ao final de cada citação, indicamos entre
parênteses o número do volume, o número da Carta,
e o número da página em que estão as palavras citadas.
Acrescentamos subtítulos entre colchetes antes de cada
fragmento. As notas explicativas numeradas vão ao final.
Para facilitar a compreensão, tomamos a liberdade de
dividir parágrafos muito longos em parágrafos menores.
(CCA)
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[1. Autoilusão Gera Falsa Clarividência.]
Suby Ram – um homem verdadeiramente bom – entretanto, está devotado a outro erro. Não à voz do seu guru – mas à sua própria. A voz de uma alma pura, altruísta, ardorosa, absorvida em um misticismo desorientado e mal dirigido.[1] Acrescente a isso uma desordem crônica naquela parte do cérebro que responde à visão clara e o segredo é logo revelado: essa desordem foi provocada por visões forçadas; por hatha ioga e um prolongado ascetismo. S. Ram é o principal médium e ao mesmo tempo o principal fator magnético que difunde a sua doença por contágio – inconscientemente para ele mesmo, ele inocula com a sua visão todos os outros discípulos.
Há uma lei geral de visão (física e mental ou espiritual) mas há uma lei especial qualificadora comprovando que toda visão deve ser determinada pela qualidade ou grau do espírito e da alma do homem, e também pela capacidade de transferir diversos tipos de ondas da luz astral para a consciência. Há uma só lei geral da vida, mas inumeráveis leis qualificam e determinam as miríades de formas percebidas e de sons ouvidos.
Há aqueles que são voluntariamente cegos e outros o são involuntariamente. Os médiuns pertencem aos primeiros, os sensitivos aos últimos. A menos que tenham sido adequadamente iniciados e treinados, no que se refere à visão espiritual das coisas e às supostas revelações feitas à humanidade em todas as épocas, desde Sócrates até Swedenborg e “Fern” – nenhum vidente ou clariaudiente treinado por si mesmo viu ou ouviu alguma vez com completa exatidão. (I, Carta 31, 169-170)
[2. Respeitar os Fundadores, e Ter Apenas Metas Nobres.]
… Nós pensamos que conhecemos mais sobre a causa secreta dos acontecimentos que vocês, homens do mundo. Assim, digo que é a difamação e o desrespeito em relação aos Fundadores e a incompreensão geral que se tem da finalidade e dos objetivos da Sociedade [2] que paralisa o seu progresso – nada mais. Não há falta de definição desses objetivos; basta que sejam adequadamente explicados. Os membros teriam de sobra o que fazer se buscassem a realidade com metade do fervor com que buscam miragens.
Lamento ver você comparando a Teosofia à pintura de uma casa em um cenário, quando nas mãos de filantropos e teosofistas verdadeiros ela poderia se tornar tão forte como uma fortaleza inexpugnável. A situação é esta: os homens que se filiam à Sociedade com o propósito único e egoísta de alcançar poder, fazendo da ciência oculta o seu único, ou mesmo seu principal objetivo, fariam melhor que não se filiassem – eles estão tão condenados à decepção quanto aqueles que cometem o erro de deixá-los acreditar que a Sociedade não tem outro propósito.
É precisamente porque fazem pregações demais sobre os “Irmãos” e muito pouco sobre Fraternidade, quando não a ignoram totalmente, que eles fracassam. Quantas vezes tivemos de repetir que quem ingressa na Sociedade com o único objetivo de pôr-se em contato conosco e de adquirir ou pelo menos assegurar-se da realidade de tais poderes e da nossa existência objetiva – está perseguindo uma miragem? Digo então, novamente. Só aquele que tem amor à humanidade em seu coração, que é capaz de compreender completamente a ideia de uma Fraternidade prática e regeneradora, tem o direito à posse dos nossos segredos. Só ele, um homem assim – jamais fará mau uso de seus poderes, e não haverá receio algum de que os dirija para fins egoístas.
Um homem que não coloca o bem da humanidade acima do seu próprio bem não é digno de se tornar nosso chela – não é digno de elevar-se em conhecimento mais do que o seu vizinho. Caso anseie por fenômenos, que ele se satisfaça com os truques do espiritismo. Tal é o estado real das coisas.
Houve um tempo em que, de oceano a oceano, das montanhas e desertos do norte até as grandes florestas e colinas do Ceilão, havia somente uma fé, um grito unificador – salvar a humanidade das misérias da ignorância em nome d’Aquele que ensinou primeiro a solidariedade de todos os homens.[3] Como está isso agora? Onde está a grandeza do nosso povo e da Verdade una? Você pode dizer que estas são belas visões que outrora foram realidades na terra, mas que se dissiparam como a luz em um anoitecer de verão. Sim; e agora estamos em meio a um povo conflituado, um povo ignorante e obstinado [4] que busca conhecer a verdade mas é incapaz de encontrá-la porque cada um a procura para benefício e gratificação pessoais, sem pensar uma só vez nos outros. Será que vocês, ou melhor, eles, nunca verão o significado e a explicação verdadeiros dessa grande ruína e desolação que invadiu nossa terra e que ameaça todas as outras – a sua em primeiro lugar [5]?
O egoísmo e o exclusivismo destruíram a nossa, e o egoísmo e o exclusivismo destruirão a sua – a qual tem, além desses, outros defeitos que não citarei. O mundo ocultou a luz do verdadeiro conhecimento, e o egoísmo não permitirá a sua ressurreição [6], porque exclui e não reconhece a fraternidade integral de todos que nasceram sob a mesma lei natural imutável. (I, Carta 33, pp. 173-174)
[3. Vingança é Algo Proibido.]
Se o meu conselho é procurado e solicitado, então, antes de mais nada a situação real e verdadeira precisa ser definida. Meus votos de “Arhat” foram pronunciados, e eu não posso buscar vingança nem ajudar outros a obtê-la. Posso só ajudá-la com dinheiro quando souber que nem um mace, nem a fração de um tael [7] será gasto em algum propósito injusto. E a vingança é injusta. Mas nós admitimos a defesa, e ela [8] tem direito a isso. Ela deverá ter plena oportunidade de justificar-se e defender-se, e é por isso que telegrafei oferecendo uma opção antes de iniciar um processo judicial. Ela tem direito de exigir uma retratação e de ameaçar com um processo, e também pode começar os procedimentos – porque ele se retratará. (I, Carta 34, p. 175)
[4. Aquele Que Trabalha Pelos Outros Beneficia a Si Próprio.]
Ao trabalhar para o seu próximo inegoisticamente e com sacrifício pessoal, você trabalhou do modo mais eficaz possível para si mesmo. Um ano produziu uma grande mudança em seu coração. O homem de 1880 dificilmente reconheceria o homem de 1881, se eles fossem confrontados. Compare-os então, bom amigo e irmão, para perceber plenamente o que o tempo fez, ou melhor, o que você fez com o tempo. Para fazer isso medite, a sós, olhando no espelho mágico da memória. Assim você verá não só as luzes e as sombras do passado, mas também o possível brilho do futuro. Assim você poderá ver oportunamente o Ego de tempos antigos em sua realidade pura. E assim, também, você terá notícias diretas de mim na primeira ocasião possível, porque nós não somos ingratos e nem mesmo o Nirvana [9] pode apagar o BEM. (I, Carta 37, pp. 179-180.)
[5. Discípulo Avançado Percebe Ondas de Pensamento Dirigidas a Ele.]
Embora você possa ter lido, em obras modernas, sobre mesmerismo, como aquilo que chamamos de “Essência-Vontade” [10] – e vocês de “fluido” – é transmitido do operador até seu ponto objetivo, você, talvez, dificilmente possa compreender como todas as pessoas demonstram esta lei de modo prático, embora inconsciente, todos os dias e a cada momento. Nem pode compreender completamente como o treinamento para o adeptado aumenta tanto a capacidade do indivíduo para emitir como para sentir esta espécie de força. Asseguro que eu, embora ainda seja apenas um humilde chela, senti os seus bons desejos fluindo até mim, assim como o convalescente nas frias montanhas sente a suave brisa que sopra sobre ele vinda das planícies abaixo. (I, Carta 37, p. 180.)
[6. Mestres Têm Interesse Pelo Ser Humano Interior.]
Com o indivíduo “visível” nós nada temos a ver. Ele é para nós apenas um véu que oculta dos olhos profanos o outro ego em cuja evolução nós estamos interessados. No rupa [11] externo, faça o que você quiser, pense o que quiser: só quando os efeitos dessa ação voluntária são vistos no corpo que está em sintonia conosco é nosso dever prestar atenção a ela. (I, Carta 42, p. 190)
[7. Aprender Teosofia é Tarefa Para a Vida Inteira.]
Você escolheu uma tarefa para uma vida inteira, e por algum motivo, em vez de generalizar, você se fixa em alguns detalhes que são extremamente difíceis para um principiante. Fique atento, meu bom Sahib. A tarefa é difícil e K. H., em homenagem aos velhos tempos, quando gostava de recitar poesia, pede-me que encerre a carta com o seguinte, para você:
“O caminho serpenteia montanha acima o tempo todo?”
“Sim, até o final.”
“E o trajeto de cada dia toma o dia todo?”
“Da manhã à noite, meu amigo.” [12]
O conhecimento, para a mente, como o alimento para o corpo, destina-se a nutrir e ajudar o crescimento, mas necessita ser bem digerido, e quanto mais completa e lentamente for encaminhado o processo, melhor será para o corpo e a mente. (I, Carta 42, p. 193)
[8. Enfrentar e Vencer os Desafios da Vida.]
O caminho através da vida terrena conduz a muitos conflitos e testes, mas aquele que nada faz para vencê-los não pode esperar nenhum triunfo. (I, Carta 43, p. 195)
NOTAS:
[1] Este trecho é da maior importância por mostrar que boa vontade, sem discernimento, pode levar a grandes desastres. O primeiro dever de quem possui boa vontade é evitar o autoengano. (CCA)
[2] Sociedade; a Sociedade Teosófica original, que deixou de existir nos anos 1890 quando Annie Besant abandonou a teosofia original. Hoje, esta frase se aplica ao Movimento teosófico. (CCA)
[3] “Aquele que ensinou primeiro a solidariedade de todos os homens”; esta é uma referência a Gautama Buddha. (CCA)
[4] O povo da Índia. (CCA)
[5] “A sua em primeiro lugar”; referência à Inglaterra. A carta é dirigida a um cidadão britânico. (CCA)
[6] O egoísmo não permitirá a ressurreição do verdadeiro conhecimento; portanto, é tarefa dos teosofistas derrotar o egoísmo, eliminando as suas causas. (CCA)
[7] Tael; unidade monetária do Extremo Oriente, no caso, a China. (Nota da edição brasileira de “Cartas dos Mahatmas”)
[8] “Ela”; H. P. Blavatsky. (CCA)
[9] Há indícios de que o Mestre passou várias semanas no Nirvana pouco antes de ditar esta carta. A carta foi ditada a um discípulo avançado, porque o Mahatma, voltando neste momento do seu Retiro em níveis muito superiores de consciência, ainda não estava preparado para entrar em contato com a vibração humana. (CCA)
[10] Este trecho da carta é escrito pelo discípulo avançado D. K. (CCA)
[11] Rupa: forma ou veículo. (Nota da edição brasileira de “Cartas dos Mahatmas”)
[12] Do poema “Up-Hill” (“Montanha Acima”), de Christina Rossetti (1830-1894). (Nota da edição brasileira de “Cartas dos Mahatmas”)
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Sobre o mistério do despertar individual para a sabedoria do universo, leia a edição luso-brasileira de “Luz no Caminho”, de M. C.
Com tradução, prólogo e notas de Carlos Cardoso Aveline, a obra tem sete capítulos, 85 páginas, e foi publicada em 2014 por “The Aquarian Theosophist”.
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