Reflexões Práticas Sobre a Arte de Ser Sincero
Carlos Cardoso Aveline
Toda palavra contém uma carga magnética.
A palavra sincera transmite a energia magnética da verdade, produzindo a substância do respeito pela vida e do sentimento fraterno. A palavra honesta une as pessoas e os seres. Ela brota naturalmente da alma imortal do indivíduo equilibrado. Uma palavra falsa – ainda que dita com intenção amável – transmite a energia do desencontro, porque está separada da verdade dos fatos.
Quando a filosofia esotérica defende o princípio básico da sinceridade, os céticos e os desinformados perguntam:
“O que é, exatamente, uma palavra verdadeira? E quem poderia julgar qual palavra é verdadeira? Quem é dono da verdade para poder fazer isso?”
Este é o argumento dos sofistas, que seguem o caminho do “relativismo radical” em relação à verdade. Tais pessoas imaginam que a verdade é aquilo que cada um quiser que seja, conforme sua conveniência de curto prazo. Um indivíduo que pensa deste modo não pode reclamar da falta de ética que existe hoje no mundo.
O que é, então, a palavra verdadeira, se tantas vezes inevitavelmente nos equivocamos em nosso pensamento? E como podemos dizer que “falamos a verdade”, se nossa visão das coisas é tão imperfeita?
A resposta para estas questões é simples. A palavra verdadeira é a palavra sincera.
O cidadão pode estar certo ou errado em sua visão das coisas, e isso é perfeitamente humano. A sua palavra, porém, deve ser honesta e deve vir do coração. Esta é a palavra verdadeira.
Quando alguém é sincero e se equivoca, aprende com o seu erro. Quando alguém é insincero com sua palavra, ainda que supostamente bem-intencionado, está cometendo um erro conscientemente.
O preço a pagar pelo erro consciente é o bloqueio do processo de aprendizagem diante da vida. Aprender é aproximar-se da verdade. Para isso, é preciso ser pessoalmente verdadeiro no limite máximo da sua capacidade.
Este princípio da filosofia esotérica é intelectualmente simples e fácil de entender. Emocionalmente, porém, trazê-lo para a vida diária pode ser algo difícil. A filosofia esotérica contraria a visão socialmente estabelecida sobre o que é uma pessoa bem-educada. Para resgatar a sinceridade na Civilização Ocidental de hoje, é preciso remover um condicionamento cultural de muitos séculos, segundo o qual as palavras que dizemos devem ser sempre amáveis na aparência – se não na intenção -, e só quando as circunstâncias externas permitirem as palavras devem ser, também, verdadeiras.
Esta é uma receita para chegar à hipocrisia.
O nosso dever é construir solidariamente uma cultura em que a sinceridade possa ser tolerada. A falta de permissão para que a palavra seja verdadeira gera ódio profundo e produz falsidade nas relações humanas.
A palavra verdadeira não é uma desculpa para lamúrias ou agressões pessoais. A palavra sincera nasce no coração bem-intencionado. Uma atitude filosófica diante da vida nos liberta da ilusão personalista, que faz com que tantas pessoas percam a maior parte da sua vida pensando em eus inferiores e assuntos pessoais, ou criticando a vida alheia. Diz um axioma teosófico: “quando tiver vontade de lamentar-se, agradeça”. Um coração puro gera a sinceridade construtiva.
O eu inferior é um instrumento para que a alma possa voar em direção a horizontes mais amplos. O foco do esforço teosófico está voltado para duas tarefas simultâneas:
1) Cabe discutir livremente nos âmbitos coletivos as questões da evolução humana e planetária.
2) Cada um deve regular a si próprio, enquanto avança passo a passo pelo caminho da autodisciplina.
Quando alguém coloca a verdade acima da crença organizada, do costume estabelecido ou da amabilidade obrigatória, está optando por uma atitude sensata que possibilita o crescimento interior. Deste modo a pessoa abandona a mera aparência de boa educação – que produz hipocrisia.
A credulidade devocional é desaconselhável, porque nega a liberdade de pensar. A teosofia respeita o valor da devoção. É um sentimento superior e fundamental. Mas a devoção deve ser dirigida sobretudo à Verdade e aos princípios impessoais da sabedoria eterna.
A devoção ao que é universal não amordaça o livre-pensamento. O estudante da Sabedoria do Oriente evita perder tempo com críticas e elogios de caráter pessoal, mas possui um espírito crítico aguçado. Ele usa os seus dois hemisférios cerebrais. Ele sabe que a alma imortal necessita tanto do hemisfério cerebral esquerdo – que vê a parte e analisa as situações em detalhe – quanto do hemisfério direito, que sintetiza, vê o todo, e é intuitivo.
O estudante que segue uma pedagogia autêntica aprimora a sua capacidade de identificar erros e acertos na vida cotidiana. Ele aprende também a deixar de lado o pensamento lógico e sucessivo, quando trata de contemplar a verdade suprema. Nesse processo, surge uma unidade dinâmica e criativa entre as inteligências do céu e da terra, e a felicidade incondicional é alcançada.
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Leia também, de C. C. Aveline, os artigos “A Palavra Correta”, “O Papel das Palavras na Vida”, “O Poder do Pensamento” e “Autodomínio pelo Controle do Pensamento”. Os textos estão disponíveis em nossos websites.
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Sobre o mistério do despertar individual para a sabedoria do universo, leia a edição luso-brasileira de “Luz no Caminho”, de M. C.
Com tradução, prólogo e notas de Carlos Cardoso Aveline, a obra tem sete capítulos, 85 páginas, e foi publicada em 2014 por “The Aquarian Theosophist”.
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