Em 1925, Vários Líderes da Sociedade de Adyar
Chegam à Conclusão de Que São Mestres de Sabedoria
Mary Lutyens
Tendo perdido o bom senso, a Sra. Annie Besant
(foto) afirma que Krishnamurti é Cristo e anuncia
que ela própria e outros iludidos alcançaram o Adeptado
(foto) afirma que Krishnamurti é Cristo e anuncia
que ela própria e outros iludidos alcançaram o Adeptado
Comentário Editorial de 2012:
Em 1894-1895, a Sra. Annie Besant obteve grande quantidade de poder político na Sociedade Teosófica de Adyar. Embora ela tivesse pouca experiência em teosofia, ela conquistou o poder acusando habilmente um dos principais fundadores do movimento, William Judge, de forjar mensagens dos Mestres de Sabedoria.
Ao mesmo tempo em que acusava Judge, no entanto, a Sra. Besant tomava parte pessoalmente de conversas mediúnicas com falsos Mestres. Isso ocorreu desde junho de 1894, em reuniões presididas pelo Sr. Alfred Sinnett.
Frustrado quando deixou de receber cartas dos Mahatmas, o ingênuo Sinnett passara a ter reuniões com Mestres imaginários através de uma médium. Poucos anos depois da morte de H. P. Blavatsky em 1891, Annie Besant, já desorientada, somou-se ao grupo de Sinnett, que registrou a adesão por escrito. [1] O fato nunca foi questionado. Ao contrário, Sinnett foi nomeado por Besant como vice-presidente mundial da Sociedade de Adyar.
Nestas atividades mediúnicas, a Sra. Besant tinha a companhia de Charles W. Leadbeater. Deve-se levar em conta o fato de que o Sr. Leadbeater nunca foi admitido na Escola Esotérica de H.P. Blavatsky enquanto ela viveu. Leadbeater havia deixado de ser discípulo dos Mestres antes da criação da Escola Esotérica em 1888. Durante o final da década de 1880 e início da década de 1890, ele foi um dos principais membros do “grupo interno” da Loja de Londres, que trabalhava sob a liderança de Alfred Sinnett. Nesta época, Sinnett já trabalhava em frontal oposição a Helena Blavatsky, que também vivia em Londres.
Foi neste ambiente que a Sra. Annie Besant buscou por inspiração ao ver-se desorientada após a morte de Helena Blavatsky. Ali Besant desenvolveu os seus “poderes psíquicos” e começou a conversar com Mestres imaginários. Com a morte em 1907 de Henry Olcott, o último fundador do movimento teosófico que ainda vivia, a Sra. Annie Besant ficou totalmente livre para acelerar suas conversas com instrutores da sua própria imaginação.
O Carma nem sempre é lento no modo como amadurece. Poucos anos depois de acusar o Sr. Judge de “forjar falsos contatos com Mestres”, a Sra. Besant começou a organizar uma Igreja Católica, adotou vários rituais neomaçônicos, e anunciou o imediato retorno de Cristo. Ela também mantinha frequentes conversas pessoais com o Manu da humanidade atual e com um certo “Rei do Mundo”.
No parágrafo de abertura de um livreto seu, publicado na Índia em 1930 sob o título de “O Trabalho do Regente e o Instrutor”[2], a Sra. Besant escreve:
“Quando o trabalho pela libertação da Índia foi encomendado a mim pela primeira vez pelo Rei em Shambala (…..)”. (p. 01)
Esta era uma referência ao seu “Rei do Mundo”. Na página 2 do mesmo livreto, ela se refere aos seus contatos pessoais com o Rishi Agastya, desde 1913.
Afirmativas como estas são, porém, apenas uma ponta do iceberg. Cinco anos antes, em 1925, a Sra. Besant havia anunciado que ela própria e outros líderes de Adyar eram Mahatmas ou Mestres de Sabedoria. Este episódio, e o seu contexto, são narrados no texto que se segue, escrito por Mary Lutyens, a biógrafa oficial de Jiddu Krishnamurti.
Não era suficiente, pois, para Annie Besant, ter contato com Mestres imaginários. Ela queria pensar que ela própria era Um Deles. Ela também esperava de Jiddu Krishnamurti que ele desempenhasse como títere obediente o papel social de “Senhor Cristo” atribuído a ele por ela própria e Leadbeater. Depois de muitas hesitações, em 1929 ele finalmente recusou-se a continuar com a representação. Porém, evitou desmontar a farsa, deixando assim de cumprir o dever ético de todo indivíduo honesto.
Nos parágrafos seguintes, Mary Lutyens usa a expressão “o Senhor” para referir-se ao “Cristo” fabricado pela Sra. Besant, personagem que, em 1925, Krishnamurti ainda fazia um esforço para personificar diante do público ingênuo e mal informado.
O texto é reproduzido do livro de Mary Lutyens “Vida e Morte de Krishnamurti”, Ed. Teosófica, Brasília, 1996, 296 pp., capítulo 7, pp. 83-86. O fato de que o livro tenha sido publicado pela própria Editora da ST de Adyar é significativo. Mary Lutyens se refere a Krishnamurti como “Krishna”. Na transcrição abaixo, usamos o nome completo. Acrescentamos algumas notas explicativas.
(Carlos Cardoso Aveline)
NOTAS DO COMENTÁRIO EDITORIAL:
[1] Veja a obra “Autobiography”, de Alfred P. Sinnett, Theosophical History Centre, Londres, 1986, 64 pp., p. 48.
[2] “The Work of the Ruler and the Teacher”, Adyar Pamphlet No. 135, 18 pp., 1930.
Besant Anuncia Que é Mahatma
[Um Trecho do Livro “Vida e Morte de Krishnamurti”]
Mary Lutyens
Alguns terrenos haviam sido doados a Krishnamurti para seu trabalho em várias partes da Austrália, e um grande anfiteatro de pedra branca fora recentemente construído em um local espetacular, nas imediações do porto de Balmoral, perto de The Manor, onde se esperava que o Senhor falasse quando viesse. Essa propriedade e as terras eram geridas por diferentes curadores a pedido de Krishnamurti.
Em meados de junho, o especialista considerou que Nitya [1] tinha melhorado o suficiente para viajar. Quando os irmãos zarparam para San Francisco, em 24 de junho, com Rosalind e um médico teosofista suíço, senti que as luzes apagavam-se na minha vida para sempre. Minha mãe [2] que supostamente tinha passado pela primeira iniciação em Sidney, já havia retornado à Inglaterra, deixando Helen, Ruth, Betty e eu em The Manor.
Foi uma viagem terrível uma vez que Nitya sentia-se cada vez mais fraco. Quase ao final dela, Krishnamurti escreveu à Sra. Besant: “Nós nos recuperaremos, e Nitya haverá de ficar bom outra vez. Este foi e tem sido um período de muita aflição, minha querida mãe, mas você e os Mestres estão aí.” Com apenas quinze dias de tratamento Abrams diário em Ojai, o estado de Nitya melhorou. Porém o alívio durou pouco, e, nos três meses seguintes, todas as energias de Krishnamurti foram para cuidar de Nitya que ficara demasiado doente para sair da cama. Krishnamurti teria ficado desesperado se não lhe tivesse sido assegurado pela Sra. Besant e por Leadbeater que os Mestres não permitiriam que Nitya morresse; sua vida era muito valiosa.
Nesse meio tempo, a Sra. Besant foi para a Inglaterra com Shiva Rao, a fim de proferir palestras no Queen’s Hall. George Arundale, que estivera numa turnê mundial com a esposa Rukmini, encontrava-se na comunidade teosófica em Huizen, na Holanda, não muito distante do Castelo Eerde, dirigido por um teosofista, bispo da Igreja Católica Liberal, James Ingall Wedgwood. Um jovem norueguês, Oscar Kollerstrom, ex-aluno de Leadbeater em Sidney e sacerdote da Igreja Católica Liberal, também estava em Huizen. Arundale telegrafou para a Sra. Besant em Londres para comunicar-lhe as coisas espantosas que estavam ocorrendo: Oscar recentemente havia passado pela terceira iniciação, Wedgwood pela segunda e Rukmini pela primeira; a kundalini tinha sido despertada em Wedgwood e Rukmini. (Arundale já passara pela segunda iniciação e tanto ele quanto Oscar diziam-se clarividentes.) Após outro exaltado telegrama, a Sra. Besant cancelou suas palestras no Queen’s Hall e partiu para Huizen, acompanhada de Esther Bright, Lady Emily, Shiva Rao e Rajagopal.
Dois dias depois da Sra. Besant chegar, em 26 de julho, Arundale foi ordenado padre e dizia-se que a Srta. Bright, Lady Emily e Rajagopal haviam passado pela segunda iniciação. Na noite de primeiro de agosto, Arundale e Wedgwood passaram pela terceira iniciação e Rukmini pela segunda. No quarto dia do mês Arundale foi consagrado bispo. O consentimento de Leadbeater para este grau foi solicitado por telegrama; como não chegasse uma resposta, Arundale afirmou que havia recebido o “cordial consentimento” de Leadbeater no plano astral. Quando retornaram da cerimônia, a Sra. Besant encontrou um telegrama de Leadbeater desaprovando veementemente o grau. Nenhum dos acontecimentos de Huizen jamais foi confirmado por Leadbeater.
Arundale continuou “trazendo” instruções dos Mestres: nenhum iniciado devia compartilhar o quarto com um não-iniciado; os padres da Igreja Católica Liberal deveriam vestir roupas de baixo de seda (isso seria muito difícil para os pobres, observou Lady Emily); os mantos deveriam ser cuidadosamente escolhidos, mas não seriam usados chapéus (pela primeira vez a Sra. Dodge negou-se a colaborar quando lhe foi solicitado que financiasse a compra das magníficas vestimentas para os bispos); a Sra. Besant, Wedgwood e os Arundale deveriam parar de comer ovos de qualquer espécie. (Segundo Lady Emily, a única que aderiu a essa instrução foi a Sra. Besant e como resultado disso ela ficou subalimentada desde então. [3])
Na noite de 7 de agosto, Arundale declarou que Krishnamurti (em Ojai) Jinarajadasa (na Índia) [4], Wedgwood e ele próprio haviam passado pela quarta iniciação, que é a iniciação do Arhat; duas noites mais tarde, Arundale “trouxe” os nomes de dez pessoas que dizia ser os doze apóstolos do Senhor. Eram a Sra. Besant, Leadbeater, Jinarajadasa, Arundale, Wedgwood, Rukmini, Nitya, Lady Emily, Rajagopal e Oscar Kollerstrom. Krishnamurti não foi consultado, mas foi dado como certo que sabia de tudo a partir do plano astral.
No número de junho do Herald, [5] Arundale anunciou que Krishna não poderia vir ao acampamento de Ommen naquele ano por causa da saúde de Nitya, mas que a Sra. Besant e ele lá estariam e esperavam que todos considerassem um especial dever comparecer. Houve poucos cancelamentos, portanto, e, em 10 de agosto, o grupo de Huizen mudou-se para Ommen onde o acampamento e o Congresso foram abertos naquela tarde (A Sra. Besant hospedou-se no Castelo). Em uma palestra, no dia seguinte, a Sra. Besant anunciou que o Senhor já havia escolhido seus apóstolos, mas que ela tinha permissão apenas de dar os nomes de sete deles, aqueles que já haviam-se tornado Arhats – ela própria, Leadbeater, Jinarajadasa, Arundale, Krishnamurti, Oscar Kollerstrom e Rukmini, a qual, ela tinha certeza, iria tornar-se Arhat em poucos dias. Só mais tarde [6], depois que lhe chamaram atenção para isso, é que a Sra. Besant percebeu que deixara Wedgwood de fora e nomeara Krishnamurti como um dos apóstolos dele mesmo. Ela retificou o engano em outra palestra pública no dia 14. O acampamento dispersou-se naquele mesmo dia, e o grupo de Huizen retornou para lá. Arundale continuou dizendo excitado: “Sei que aconteceu alguma coisa, mas parece impossível”. Na manhã seguinte, a Sra. Besant chamou Esther Bright, Lady Emily, Rukmini e Shiva Rao em seu quarto e contou-lhes, acanhada, que ela, Leadbeater, Krishnamurti, Jinarajadasa, Arundale, Wedgwood e Oscar tinham passado pela quinta e definitiva iniciação na noite do dia 13, mas isso não faria diferença na maneira com que deveriam ser tratados.
Lady Emily teve uma crise de euforia na ocasião em Huizen, e escreveu entusiasmada para Krishnamurti sobre isso. Ele lhe enviou um telegrama perguntando se Leadbeater confirmara todos esses acontecimentos. Ela lhe telegrafou dizendo que a própria Sra. Besant os estava anunciando e acrescentou: “Deposite sua confiança nela”.
Quando Lady Emily retornou a Londres encontrou uma carta muito infeliz de Krishnamurti, cheia de ceticismo. Ela destruiu, a seu pedido, todas as cartas que ele lhe enviou neste período doido [7] ; ele temia que pudessem parar em outras mãos e ferir a Sra. Besant que escrevera a ele, suplicando-lhe que confirmasse tudo que Arundale tinha “revelado”. Para não magoá-la, ele simplesmente respondeu que estivera distante e muito ocupado cuidando de Nitya para saber de qualquer coisa àquele respeito. [8]
NOTAS:
[1] Nitya: irmão de Krishnamurti, que estava doente e que morreria pouco mais tarde, apesar das promessas feitas pelos falsos Mestres de Besant e Leadbeater de que eles o curariam.
[2] Lady Emily Lutyens.
[3] Por um lapso na tradução, as palavras “e como resultado disso ela ficou subalimentada desde então” foram omitidas da edição brasileira da obra. Ver a edição original, “The Life and Death of Krishnamurti”, Mary Lutyens, Krishnamurti Foundation India, 1990, p. 56.
[4] Jinarajadasa. Em seu livro, Mary Lutyens usa a forma abreviada “Raja” para referir-se a C. Jinarajadasa.
[5] “The Herald of the Star”, a revista criada especialmente para o “Cristo teosófico”, ou “o Senhor”.
[6] “Só mais tarde”. Por um lapso da tradução, a edição brasileira diz “Dois dias mais tarde”. Não há menção a “dois dias” na edição original. Ver “The Life and Death of Krishnamurti”, Mary Lutyens, Krishnamurti Foundation India, 1990, p. 56.
[7] Na edição original em inglês, temos “crazy”; “doido”, “louco” ou “maluco”. Na edição brasileira, no entanto, aparece “instável” ao invés de “doido”.
[8] Para que pudesse continuar representando o papel de Cristo, seria politicamente incômodo para Jiddu Krishnamurti confessar ao público a verdade sobre as falsas iniciações atribuídas a ele e a outros. Para o verdadeiro movimento teosófico, no entanto, a verdade é mais importante que conveniências políticas; as amizades sinceras se baseiam sobre a verdade; não há motivos para acobertar falsidades, e as fraudes de Annie Besant, C. W. Leadbeater, James Wedgwood e George Arundale não são exceções.
000
O texto acima é reproduzido da edição de abril de 2012 de “O Teosofista”, cuja coleção completa pode ser encontrada em nossos websites associados.
000
Em setembro de 2016, depois de cuidadosa análise da situação do movimento esotérico internacional, um grupo de estudantes decidiu formar a Loja Independente de Teosofistas, que tem como uma das suas prioridades a construção de um futuro melhor nas diversas dimensões da vida.
000