Um Alerta às Autoridades dos Diferentes
Países, e a Todos Que Receberem Esta Carta
São Francisco de Assis
A edição de 1979 dos Escritos, e o retrato mais antigo de Francisco, feito em 1228
Nota Editorial de 2022:
O exemplo prático dado pelos líderes exerce uma influência silenciosa, cuja força e poder são muito grandes. Não por acaso, no Velho Testamento, o livro “Eclesiástico” afirma:
“Tal como o governante do povo são os seus ministros. Do modo como é aquele que governa a cidade, assim são todos os seus habitantes. Um rei sem instrução arruinará seu povo; uma [boa] cidade será construída graças à inteligência dos seus chefes.” (10: 1-3)
Seja correta ou incorreta, a atitude dos dirigentes passa, por osmose, para a comunidade inteira; ou pelo menos para a maior parte dela. E disso resulta um fato inevitável. É grande em todos os povos a responsabilidade histórica dos membros das chamadas elites, e dos dirigentes das cidades, das aldeias e nações.
O documento a seguir está entre os escritos considerados autênticos de Francisco de Assis. A data provável é 1220. [1]
Expresso na linguagem clássica do cristianismo da Idade Média, o texto de Francisco será melhor compreendido levando em conta algumas chaves de leitura e de interpretação dadas pela filosofia esotérica de Helena Blavatsky.
O nome Jesus Cristo, por exemplo, não designa simplesmente um líder espiritual que viveu em determinado momento. Simboliza sobretudo a alma espiritual de cada ser humano, o mestre interno, a voz da consciência, o princípio búdico, a consciência divina.
O Dia do Julgamento pode ser qualquer processo de profundo ajuste cármico, individual ou coletivo; mas em geral significa aquele primeiro momento do pós-morte em que é definido o rumo dominante do intervalo entre duas encarnações, seja na direção de um pós-morte mais espiritual, seja na direção de um pós-morte menos espiritual.
A palavra Inferno simboliza as dificuldades cármicas que se seguem a uma vida em que a ética e o altruísmo estiveram mais ou menos ausentes.
As expressões Senhor ou Deus Nosso Senhor são personificações simbólicas da Lei universal da Justiça, a lei do Carma e do Equilíbrio, segundo a qual “o que se planta, se colhe”.
A maldição do Senhor significa o mau carma decorrente de ações moralmente equivocadas. Quando se planta egoísmo, colhe-se sofrimento.
O Corpo e o Sangue do Senhor Jesus Cristo são a realidade e o espírito da sabedoria universal, da qual o Mestre é uma manifestação.
A transcrição a seguir busca um ponto ótimo entre diversas versões do documento (entre as quais não há conflito de conteúdo). Evitamos o uso da segunda pessoa do plural, “vós”. Não incluímos as referências bíblicas que interrompem a carta a todo momento nas versões das obras franciscanas publicadas pela Editora Vozes. As referências de estudo bíblico não fazem parte de todas as transcrições disponíveis do documento. Portanto, sua inclusão é opcional. [2] Livre de interrupções, a carta fica simples e direta, conforme era o estilo do seu autor. O fluxo do pensamento permanece claro e sem fragmentações.
É fácil perceber que, quando a lemos corretamente, a Carta de Francisco é uma grande aula de ética e uma lição sobre a lei do carma. Durante a primeira metade do século 21, o documento está mais atual do que nunca, tanto no mundo lusófono como nas outras nações do planeta.
(Carlos Cardoso Aveline)
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Carta aos Governantes dos Povos
São Francisco de Assis
A todos os potentados e conselheiros, juízes e governantes no mundo inteiro, e a todos quantos receberem esta carta, Frei Francisco, mísero e pequenino servo no Senhor, deseja saúde e paz.
Considerem e vejam que se aproxima o dia da nossa morte.
Peço pois com todo o respeito de que sou capaz que, no meio dos cuidados e solicitudes que os senhores têm neste mundo, não esqueçam do Senhor, nem se afastem dos Seus mandamentos.
Pois todos aqueles que o deixam cair no esquecimento e se afastam dos seus mandamentos são amaldiçoados e serão por Ele entregues ao esquecimento.
E quando chegar o dia da morte, tudo o que pensavam que possuíam será tirado deles. E quanto mais sábios e poderosos tiverem sido neste mundo, tanto maiores tormentos sofrerão no inferno.
Por isso aconselho-os encarecidamente, meus senhores, que deixem de lado todas as ocupações e ansiedades e recebam com amor o santíssimo Corpo e o santíssimo Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, ao lembrar Dele.
E prestem uma homenagem tão grande ao Senhor, com o povo colocado aos seus cuidados, que todas as tardes, façam anunciar por um pregoeiro ou por outro meio qualquer que todo o povo deve render graças e louvores ao Senhor Deus todo-poderoso.[3] E se o não fizerem, saibam que haverão de prestar contas perante o Senhor Jesus Cristo no dia do Juízo.
Os que levarem sempre consigo este escrito e agirem de acordo com o seu conteúdo devem saber que serão abençoados por Deus Nosso Senhor.
NOTAS:
[1] Sobre a autenticidade histórica do documento, ver “Os Escritos de São Francisco de Assis”, Editora Vozes, Petrópolis, RJ, 1979, 289 pp., ver pp. 41-42. E também “São Francisco de Assis, Escritos e Biografias”, crônicas e outros testemunhos do primeiro século franciscano, Editora Vozes, Petrópolis, Rio de Janeiro, sexta edição, 1991, 1.372 páginas, ver página 98, nota de rodapé. A data provável, 1220, está indicada na mesma nota de rodapé à p. 98 de “São Francisco de Assis, Escritos e Biografias”.
[2] O documento está transcrito sem interrupções, por exemplo, no volume “St. Francis of Assisi”, a new translation by Leo Sherley-Price, the Saint as seen by his contemporaries in ‘The Mirror of Perfection’ together with all his known writings. Harper & Brothers Publishers, New York, USA, copyright 1959, 234 pp., ver pp. 193-194. Talvez as numerosas referências bíblicas sejam enxertos teológicos acrescentados após a época em que Francisco viveu.
[3] A melhor forma de louvor é a ação ética e solidária nos diferentes aspectos da vida. (CCA)
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O texto “Carta de Francisco aos Governantes” foi publicado nos websites associados dia 25 de julho de 2022. Trata-se de uma reprodução revisada das páginas 177 e 178 do volume “Os Escritos de São Francisco de Assis”, Editora Vozes, Petrópolis, RJ, 1979, 289 páginas. Título original: “Carta aos Governantes dos Povos”. O documento está disponível também em obras citadas mais acima, cujas versões foram consultadas como apoio.
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