Fortaleça a Consciência
da sua Dignidade Pessoal
 
 
Jean des Vignes Rouges
 
 
 
 
 
Você tem mesmo certeza de que possui o direito de viver? Você não sente às vezes que é um indivíduo sem importância, cujo destino é esconder-se humildemente entre as últimas fileiras das multidões que correm em direção à vitória?
 
Reconheça que esses sentimentos paralisam com frequência os seus pensamentos e as suas ações. Você tem este problema! A prova está na admiração amarga e até invejosa que você sente por aqueles que demonstram uma ousadia magnífica.
 
Você pergunta: – Como eles conseguem ter esse atrevimento? Tenho sempre medo de prejudicar os interesses dos outros, nunca ouso levantar a voz, tenho medo de ser “rejeitado”, sempre me pergunto com base em quais direitos eu faria alguma reclamação ou exigência!
 
Pensando logicamente, você tem razão. Todo homem tem uma dívida imensa para com a sociedade. Essa circunstância, do ponto de vista da justiça, impõe mais deveres do que direitos. Mas, felizmente, a criança recém-nascida não se preocupa com o fato de que lhe faltam títulos de propriedade. Ela exige a sua mamadeira; e, dentro de certos períodos de tempo, a mamadeira lhe é dada. Isso transmite ao bebê um forte sentido dos seus direitos.
 
No entanto, acontece que ele precisa ficar muito tempo esperando pela mamadeira; neste caso ele observa que suas reclamações não têm efeito. Pais e professores excessivamente rigorosos o fazem pensar que só tem um direito: o direito de permanecer em silêncio. Esse método de educação pode fazer da criança, mais tarde, um reivindicador incansável, se ela tiver um temperamento forte, ou uma pessoa modesta que sempre esperará com sabedoria até que alguém decida dar-lhe atenção.
 
De outro lado, por mais dedicados, afetuosos e inteligentes que tenham sido os nossos pais, não podemos afirmar que as suas exigências de educadores – legítimas, aliás, porque se tratava de transformar num ser civilizado o pequeno selvagem que nós éramos – não tenham produzido em nós numerosos “complexos de inferioridade” – sejam eles pequenos ou grandes. De modo que, antes de estender a mão para agarrar um dos frutos da árvore da vida, sentimos uma espécie de escrúpulo; as proibições ouvidas no passado ainda soam obscuramente em nossos ouvidos: “Eu proíbo… Você não tem o direito!…”
 
Ah! Certamente, muitos acabam ficando completamente surdos a esses ecos do passado. Nós os vemos muito satisfeitos enquanto empurram os outros para agarrar os melhores lugares; mas você, que me lê, você não é um deles; os seus direitos parecem pouco claros para você.
 
– De fato – diz você – os meus méritos são tão pequenos!
 
– Está errado! É preciso rever essas avaliações, caso contrário você nunca alcançará aquela autoconfiança que caracteriza o homem de vontade forte.
 
Ponha em ação portanto o seu senso de justiça, para que seus direitos fiquem inscritos como um texto solene em sua própria consciência. Uma maneira prática de fazer isso é a seguinte: escreva numa folha de papel, em letras grandes, estas palavras: “Para meu crédito”. Em seguida procure em sua memória lembranças dos esforços valiosos que você fez em sua vida. Existem muitos! Reflita. Ah! Como eles surgem com rapidez! Principalmente, o que é lamentável, aqueles esforços que não receberam uma recompensa. “Eu trabalhei muito naquele ano. E ainda assim o resultado foi medíocre! Prestei tal serviço… Renunciei… Economizei… Reprimi em mim aquele desejo, cuja manifestação teria contrariado os outros, resisti às tentações. Dediquei-me ao meu dever… Obedeci às leis, aos apelos da caridade… Fiz o serviço militar…”.
 
Escreva tudo. A lista fica cada vez mais longa! … Parece que não vai ter fim. Enquanto faz a lista, você sente às vezes crescerem em seu interior a amargura, a decepção e a indignação; esta é uma prova de que o seu instinto de justiça está acordado. Ele se deixa irritar com tanta facilidade, em todos os seres humanos!
 
Continue escrevendo. Você fica insatisfeito quando pensa em todas aquelas boas ações que fez e que não foram apreciadas por quem deveria recompensá-las.
 
Mas não permaneça preso neste estado de espírito do credor raivoso que elabora a lista dos empréstimos que fez e não foram pagos; você só conseguiria ter o estado de alma do rebelde derrotado; você se tornaria um “fracassado” que culpa eternamente por suas próprias derrotas o destino, a sociedade, a família e os outros.
 
Ao invés disso, use a emoção que essas lembranças despertam para apoiar a sua convicção de que você tem direitos a reivindicar.
 
Mas, ao mesmo tempo, pense nas melhores maneiras de ser “recompensado”. Você logo reconhecerá que, na vida real, aqueles que recebem o que lhes é devido nem sempre são os credores mal-humorados que exigem o pagamento com cara feia; e isso acontece porque as relações humanas não são reguladas apenas por princípios legais rígidos. Os costumes e os hábitos sociais precisam ser aceitos com uma certa complacência, uma certa boa vontade, para que os méritos de alguém sejam reconhecidos.
 
Portanto, não adote a atitude de uma pessoa exigente. Em vez disso, comporte-se como alguém que não imagina que os seus direitos possam ser ignorados.
 
Você tem essa convicção porque guarda no seu bolso, mais precisamente no seu Caderno da Vontade [1], a longa lista dos esforços que fez e das obras que realizou. Esses são títulos de propriedade sérios, que naturalmente despertam uma atitude confiante e digna. É por isso que você fala e age como se fosse evidente que você tem o direito de se expandir amplamente na vida. Nenhuma disputa é possível. Deste modo, você dá sua opinião em uma discussão, solicita o que lhe é devido e ocupa um bom lugar tanto num meio de transporte coletivo como numa reunião de conselho administrativo.
 
Em resumo, eu recomendo a você que coloque a sua confiança em si mesmo sobre a base da consciência do seu valor. É a partir da convicção de que você fez os esforços necessários para se tornar mais inteligente, mais forte e mais justo, que você terá a compreensão dos seus direitos. Você lutou para se afirmar, para alcançar a harmonia interior, para estabelecer o domínio da vontade moral, da gentileza e da verdade. Você resistiu ao desânimo, ao sofrimento e venceu a preguiça. Você “esculpiu sua própria estátua”, isto é, criou a sua personalidade conforme a sua natureza original. Além disso, a cada dia, a cada momento, você aprimora o homem que é, para se tornar ainda mais nobre, para ter mais beleza moral e ser moralmente maior. Bem, isso é uma obra de arte! É um belo trabalho! Tenha orgulho desse fato. Você tem a “obrigação” de ser autoconfiante.
 
Apresente-se, pois, na vida, como um oficial de justiça que possui uma autorização formal e que não duvida por um só instante do seu direito de tomar posse de algo.
 
Porém, não exagere. Não pense que você tem o direito de se expandir infinitamente empurrando seus vizinhos, porque neste caso a sua autoconfiança transformaria você num mal-educado insolente contra o qual haveria uma indignação unânime. 
 
NOTA:
 
[1] Veja o artigo “O Caderno da Vontade”. (CCA)
 
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O artigo acima foi publicado nos websites da Loja Independente de Teosofistas no dia 20 de fevereiro de 2025. Trata-se de uma tradução do livro «Dictionnaire de la Volonté», de Jean des Vignes Rouges, Éditions J. Oliven, Paris, 320 pp., 1945, pp. 105-107. Tradução: Carlos Cardoso Aveline. O artigo original em francês está disponível online: “Droits – Avoir Conscience de Ses Droits”.
 
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Jean des Vignes Rouges é o pseudônimo literário do militar e escritor francês Jean Taboureau (1879-1970).
 
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Helena Blavatsky (foto) escreveu estas palavras: “Antes de desejar, faça por merecer”.
 
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