A Força da Sinceridade Serve Como
Vacina Moral Para Preservar a Vida
Carlos Cardoso Aveline
A transição vivida pela presente civilização planetária ocorre ao mesmo tempo nas diferentes dimensões da realidade. Para compreendê-la melhor, é necessário um enfoque interdisciplinar.
O aspecto econômico da transformação produz dilemas éticos e percepções teosóficas. Na medida em que as visões dominantes da sociedade são materialistas, a “luta pela sobrevivência” influencia, poderosamente, a substância do carma que vai sendo acumulado.
Os economistas convencionais têm, com frequência, uma visão estreita. O autor de best-sellers James Rickards ajuda a desmascarar o mundo ilusório da chamada ‘ciência econômica’ de hoje. O fato fica claro quando lemos estes fragmentos do seu livro de 2016 “O Caminho Para a Ruína”:
* … As elites vivem em bolhas e, frequentemente, são as últimas a descobrir a iminência de uma crise. (p. 10)
* Economia é uma ciência? Sim, e é aí que o problema começa. Economia é uma ciência, mas a maioria dos economistas não são cientistas. Economistas agem como políticos, padres ou publicitários. Eles ignoram as evidências que não se encaixam em seus paradigmas. Economistas desejam o prestígio científico sem o trabalho de se ater a seu rigor. O fraco crescimento mundial de hoje pode ser imputado a essa impostura. (p. 11)
* Ainda assim, a maioria dos economistas acadêmicos não são cientistas; são dogmatistas. Eles se agarram a uma versão antiga de sua ciência, fecham-se a novas ideias e descartam os dados que contradizem seu dogma. (p. 12)
* Com um sistema financeiro tão vulnerável e com formuladores de políticas tão despreparados, medidas extremas serão necessárias quando a catástrofe chegar. (p. 12)
* Churchill uma vez enviou um cabograma para Keynes que dizia, “Estou começando a concordar com você.” Keynes respondeu, “Que pena. Estou começando a mudar de ideia.” Seria tão revigorante se os economistas de hoje tivessem a mente um pouco aberta como os de antigamente. (p. 13)
* Sistemas de crença são reconfortantes. Eles proporcionam certezas em um mundo bastante incerto. Para seres humanos, certezas são valiosas, mesmo que sejam falsas. Falsidade pode ter consequências de longo prazo, no entanto, conforto ajuda a enfrentar o dia a dia. (p. 15)
* O fator conforto se enraíza quando há modelos matemáticos para apoiá-lo. A matemática financeira moderna intimida. Ph.D.s que passam anos estudando-a têm um interesse manifesto em manter uma fachada. O conhecimento da matemática reforça suas credenciais e exclui os menos iniciados no lema de Itô. A matemática financeira também é chamada de elegante por seus praticantes. Se você aceita o paradigma das finanças modernas, a matemática fornece uma infinidade de soluções para problemas difíceis (…). Ninguém questiona o paradigma. (p. 15)
* Essa fachada financeira é reforçada pela tirania do conhecimento acadêmico. Um jovem intelectual em um programa de estudos financeiros de difícil acesso estará preocupado com bolsas de estudos, publicações e nomeações para vagas em universidades. Abordar um orientador sexagenário com um projeto que refuta o que orientador tem prezado há décadas não é uma decisão astuta em relação à carreira. (p. 15)
* Também há a inércia pura e simples, como ficar na cama quentinha em uma manhã fria. Acadêmicos também têm sua zona de conforto. Conhecimento novo é como dar um mergulho no inverno – estimulante e revigorante, mas não para todo mundo. (p. 16)
* A preferência pela certeza em detrimento da incerteza, o fascínio pela matemática elegante, a mentalidade acadêmica fechada e a inércia são boas explicações do porquê paradigmas incorretos persistem. (p. 16) [1]
As ideias de Rickards são claras. Em filosofia esotérica, a força cega da inércia, ou Tamas, é um obstáculo à busca da verdade. Na sua obra “Ísis Sem Véu”, H.P. Blavatsky cita Sergeant Cox:
“Não há falácia mais terrível que a ideia de que a verdade prevalecerá por sua própria força, e de que basta ela ser vista para ser aceita. O desejo de alcançar a real verdade existe em muito poucas mentes, e a capacidade de distingui-la em um número menor ainda. Quando os seres humanos dizem que estão buscando a verdade, eles querem dizer que estão procurando por evidências que apoiem algum preconceito ou predisposição. Suas crenças são moldadas pelos seus desejos.” [2]
Enquanto estuda os paradoxos da nossa civilização organizada em torno do dinheiro, James Rickards mantém a mente aberta diante da sistemática negação dos fatos, por parte de muitos. E ele afirma:
“Se apenas reputações acadêmicas estivessem em jogo, o mundo poderia ser paciente. A boa ciência vence no final. Mas há muito mais em jogo. A riqueza mundial está em risco. E quando ela é destruída, a consequência é a instabilidade social.” [3]
“O Caminho Para a Ruína” ajuda os cidadãos a compreenderem o quebra-cabeças cármico que desafia a humanidade. O livro de 2016 também faz uma ou duas advertências:
“A questão essencial na economia hoje é se os mercados de capitais são sistemas complexos. Se a resposta for sim, então todo modelo de equilíbrio em economia financeira está obsoleto.”[4]
Quanto ao final do velho sistema financeiro e monetário, Rickards anunciou:
“A próxima crise virá antes que o ciclo de alívio atual tenha sido revertido. Os bancos centrais estarão indefesos, exceto pelo uso de novos e sólidos programas de flexibilização quantitativa. Essa nova criação de consumo de dinheiro irá testar os limites externos da confiança no dinheiro do banco central.”
“Além dessa lista de catalisadores resultante do ouro, da dívida, da deflação e da inadimplência, há ameaças exógenas que surgem no espaço geopolítico e rapidamente causam os pânicos financeiros. Essas ameaças incluem guerras convencionais, cyberguerras, assassinatos, suicídios proeminentes, interrupções da rede elétrica e ataques terroristas.”
“Por último, há desastres naturais, como terremotos, erupções vulcânicas, tsunamis, furacões de categoria cinco e epidemias mortais.” (pp. 246-247)
O carma desta civilização é o carma de um forte apego material. A complexa crise começada em 2020 apresentou-se inicialmente como uma pandemia. Os seus aspectos econômicos, no entanto, cumprem um papel decisivo.
James Rickards mostrou em 2016 o perigo de uma pandemia como metáfora para descrever a súbita transmutação financeira que ele considera inevitável:
“Gestores de risco e reguladores utilizam a palavra ‘contágio’ para descrever a dinâmica dos pânicos financeiros. Contágio é mais do que uma metáfora. Doenças contagiosas, como o Ebola, espalham-se da mesma maneira exponencial que (…) reações em cadeia e pânicos financeiros. Uma vítima do Ebola pode infectar duas pessoas saudáveis, então essas duas pessoas recentemente infectadas infectam mais duas cada e assim por diante. O resultado é uma pandemia, e uma quarentena é necessária até que uma vacina seja encontrada. (…)”
“Em um pânico financeiro, imprimir dinheiro é uma vacina. Se a vacina se mostrar ineficiente, a única solução é a quarentena, que significa fechar bancos, bolsas e fundos de mercado monetário, desligar caixas eletrônicos e ordenar que gestoras de ativos não vendam títulos.” (p. 34)
O que os teosofistas têm a dizer sobre a prática da ação correta em uma situação tão complexa?
A honestidade, a ética e o discernimento são indispensáveis no enfrentamento das crises, para que possamos construir uma transição saudável até a economia e a sociedade do futuro.
Os perigos trazem oportunidades sagradas, e a boa vontade produz carma positivo. A força (individual e coletiva) da sinceridade pode ser suficiente para evitar a confusão desnecessária. Na medida em que haja bom senso e o sentimento de respeito pela vida seja dominante, a prática da cooperação fraterna prevalecerá.
NOTAS:
[1] “O Caminho Para a Ruína”, James Rickards, Empiricus, São Paulo, 2017, 370 pp.
[2] Da obra “Ísis Sem Véu”, de Helena P. Blavatsky. Em inglês, veja “Isis Unveiled”, volume I, p. 615. Em português, veja outra tradução deste trecho em “Ísis sem Véu”, Ed. Pensamento, SP, vol. II, p. 283.
[3] “O Caminho Para a Ruína”, James Rickards, Empiricus, p. 16.
[4] “O Caminho Para a Ruína”, James Rickards, Empiricus, p. 18.
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O artigo “James Rickards e a Economia da Ética” foi publicado nos websites associados dia 15 de abril de 2020. Trata-se da tradução de um artigo publicado no blog do autor em “The Times of Israel”: “James Rickards and the Economy of Ethics”.
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