As Trevas se Dissipam,  a Vida Ressurge
 
 
Júlio Dinis
 
 
 
 
 
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Nota Editorial de 2017
 
O poema a seguir é reproduzido
do livro “Poesias”, de Júlio Dinis,
Publicações Europa-América, Mem
Martins, Portugal, 1999, 263 pp., pp. 74-75.
 
Júlio Dinis expressa com estes versos a força
da consciência ambiental clássica do século 19. A 
natureza existe em unidade com o mundo sagrado,
 e o poema vale também como metáfora e símbolo
do renascer de uma vida espiritualmente plena.  
 
(Carlos Cardoso Aveline)
 
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À luz do sol nascente
Resplendem pelas selvas
Mil pérolas nas relvas
Nos ares mil rubis;
No azul do céu nevoado
Não brilham as estrelas,
Mas são imagens delas
As flores do tapiz.
 
As aves perpassando
Agitam a ramagem,
E a perfumada aragem
Nos bosques se introduz;
Aí mil vozes falam
Ao céu sereno e mudo;
No bosque é sombra, tudo,
No céu é tudo luz.
 
Ridente madrugada,
Hora em que do oriente
Com o gládio refulgente
O arcanjo da luz vem;
E as trevas se dissipam,
Com as trevas a tristeza,
Que em toda a natureza
A noite eivado tem. [1]
 
Oh! vinde, vinde ao prado
Que o orvalho ainda umedece;
Ali tudo parece
A vida ressurgir
Em vórtices contínuos,
Em doudejantes valsas
Elevam-se das balsas
Insetos a zumbir.
 
Subi do prado ao vértice
Da florida colina,
Então pela campina,
Os olhos prolongai:
Ao longe, ao longe as vagas,
Lutando nos fraguedos; [2]
Mais perto os arvoredos
Que o arroio banhar vai.
 
A tudo anima a esperança
No monte e vale e praia;
No céu Vésper [3] desmaia
Ao matutino alvor.
O cântico das aves,
Das flores o aroma
Nos diz: – O dia assoma!
Hossana ao Criador! – [4]
 
1 de Junho de 1862
 
 
NOTAS:
 
[1] Que em toda a natureza a noite tem eivado, isto é, que a noite tem manchado,  contaminado. (CCA)
 
[2] Fraguedos: rochas, penhascos, pedras. (CCA)
 
[3] Vésper: a estrela vespertina, Vênus. (CCA)
 
[4] Em teosofia, a ideia de um “Criador” simboliza a Lei universal, o espírito coletivo das inteligências divinas, e também o eu superior ou alma espiritual de cada indivíduo. (CCA)
 
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Júlio Dinis, autor do romance “As Pupilas do Senhor Reitor”,  é o nome literário do escritor português Joaquim Guilherme Gomes Coelho. Viveu 32 anos incompletos: nasceu em 14 de novembro de 1839 e morreu em 12 de setembro de 1871.
 
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