A Intuição, ou Faro, é a
Aventura do Pensamento
 
 
Jean des Vignes Rouges
 
 
 
 
 
Nota Editorial de 2024:
O Instinto, o Faro, a Intuição
 
Faro, dizem os dicionários, é o olfato em geral, e especialmente o olfato dos animais, mais eficiente que o dos humanos. Faro significa ainda intuição, instinto, palpite certeiro. Constitui uma capacidade instantânea de adivinhar, que não passa pelo raciocínio.
 
No texto a seguir, JVR examina exemplos concretos sobre como funciona o faro humano, ou a plena atenção. Ele faz uma fotografia psicanalítica das motivações humanas. Começa descrevendo situações materiais, e depois passa a enfrentar filosoficamente os grandes desafios da vida.
 
(Carlos Cardoso Aveline)
 
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1) Os Milagres do Faro
 
Quanto a mim, declara um leitor, eu tenho um meio bem simples de conciliar os “prós” e os “contras”; eu confio no meu faro.
 
Esta maneira de funcionar tem o seu valor. Mas aqui, também, creio que é do seu interesse aprofundar a noção confusa que geralmente temos sobre este fenômeno: o faro. Para realizar este estudo, examinemos um caso concreto.
 
– A alta está começando, diz aquele sujeito, eu vejo, eu sinto o cheiro. Então, compro hoje para revender amanhã com lucro.
 
No entanto, o seu vizinho, igualmente confiante no seu próprio faro, vende para depois comprar a preços mais baixos.
 
Será preciso considerar esses dois personagens como dois jogadores que só o acaso fará ganhar ou perder? Nem sempre. A prova disso é dada pela persistente “boa sorte” de um e pela obstinada “má sorte” do outro; ao constatarmos este fato temos, portanto, motivos para pensar que realmente existem indivíduos dotados da capacidade de antever eficientemente o futuro.
 
Através de que processos psíquicos um homem que tem faro consegue sentir o que deve ser dito e feito para ter êxito? Ele não parece ser guiado por cálculo algum. É uma coisa curiosa. Ele nem parece fazer esforço para pensar, antes de agir. Quando está numa situação difícil, ele de repente parece farejar o vento … É o suficiente. Uma ideia surgiu em sua mente. E é o caminho certo! Lá vai ele, como um cão de raça pura, na trilha da caça.
 
Ao verem este milagre, grande quantidade de ingênuos reagem dizendo: “Que método excelente! Chega de raciocínios, não mais planos, deduções, nada de cálculos! Todas essas operações mentais são longas, complicadas, enfadonhas e, em última análise, apenas provocam uma hesitação interminável. Enquanto isso, o impulso inicial do faro esclarece instantaneamente as situações mais complicadas, estimula as pessoas à ousadia e as empurra para a frente. Viva o faro, graças ao qual a verdade nua e crua aparece diante de mim bela e pura!”
 
Sim, o único problema é que quando olhamos mais de perto o comportamento destes entusiastas, e principalmente o grau de êxito que eles têm, vemos que são uns adoidados e naufragam ao encontrar o primeiro obstáculo.
 
Antes de confiar no seu faro, ou no seu palpite, é bom verificar a qualidade desse instrumento de orientação. A propensão a aceitar alegremente as sugestões do faro não seria uma indicação de que temos um caráter fantasioso? É muito agradável tomar decisões sob a proteção do faro … até o dia em que você percebe que o seu faro não passa de uma impulsividade incoerente, ou de uma repulsa teimosa diante da necessidade de fazer um esforço para refletir.
 
Um exame de consciência feito com honestidade, e tendo por base os fatos do seu passado, torna possível examinar a nitidez e o alcance do seu faro. Será quase inevitável que você perceba: esta função preciosa precisa ser monitorada e controlada pela razão.
 
Essa é a dura verdade, infelizmente! Eu digo, infelizmente, porque todos sabemos que a própria razão é um instrumento imperfeito. Diante da complexidade da vida, a lógica raciocinada é muitas vezes forçada a confessar a sua impotência. Ela não pode abranger todos os fatos da maior parte dos problemas que enfrentamos. E é por isso que, depois de sofrer as dores da perplexidade racional, confiamos tantas vezes no nosso faro. Contudo, seria uma idiotice desprezar o instrumento da vitória que é a inteligência.
 
Então, como se pode reconciliar e harmonizar esses pontos de vista contraditórios? Aqui está a solução: devemos considerar o faro como uma expressão da força vital, e a consciência lúcida como uma máquina a ser usada para fazer a triagem e a classificação das ideias que surgem tumultuosamente do inconsciente.
 
2) O Mecanismo do Faro
 
Imagine então o mecanismo do faro eficiente mais ou menos da seguinte maneira. Em primeiro lugar, um dinamismo vital, semelhante a um instinto, que, agindo sob a necessidade imperiosa de uma adaptação exigida pelas circunstâncias, faz com que o inconsciente comece a borbulhar, de modo que as ideias surgem por geração espontânea. Essa efervescência confusa flui para estruturas neuronais que lhe dão formas. Neste ponto a descarga psíquica sobe à consciência e é traduzida em pensamentos claros.
 
Se o indivíduo não tem experiência, se sua memória não lhe dá referências capazes de funcionar como freios ou pontos de comparação que permitam fazer uma avaliação; se algum sentimento intenso o agita excessivamente, como a ambição, o amor ao lucro, o orgulho ou o desejo de vingança, as ideias que surgem na sua consciência, filhas da sua sensibilidade, o fascinam a tal ponto que ele exclama, ao vê-las: “Eu amo vocês, eu as adoto… Meu faro me guia!” E o sujeito faz alguma coisa idiota, a menos que o acaso – que às vezes é muito útil – o favoreça.
 
Mas se o sujeito tem uma grande experiência, o drama psíquico se desenrola de forma diferente. Assim que as energias inconscientes entram em movimento, encontram nas profundezas da alma toda uma zona que foi “estruturada” pela experiência prática das situações. Em algumas ocasiões o indivíduo sofreu duramente com os fracassos, outras vezes experimentou a embriaguez do triunfo. Isso deixou nele traços que não permanecem inertes. Sua alma está marcada pelo passado, constantemente pronto para despertar, para vibrar, para entrar em movimento, para inventar ideias que ajudem a evitar o sofrimento ou que o orientem para o prazer do sucesso. Este homem pode confiar em seu faro. Assim que uma ideia se apresenta à mente, ela é classificada, apreciada, adotada ou rejeitada. É avaliada instantaneamente. A consciência clara funciona como uma espécie de filtro aperfeiçoado, prendendo as impurezas e permitindo a passagem de ideias saudáveis.
 
Disso tudo eu concluo o seguinte: se você é um iniciante na vida e na profissão, não se vanglorie descuidadamente do seu “faro”. Se fizer isso, muitas de suas decisões serão provavelmente inadequadas. Tenha a coragem de reconhecer que em certas circunstâncias o verdadeiro faro consiste em descobrir o valor das opiniões de certas pessoas mais velhas, leais e competentes, reveladas quando falam sobre tudo e sobre nada – ou sobre psicologia, por exemplo.
 
3) O Papel do Faro na Vida Cotidiana
 
“Obrigado pelo conselho”, você diz. Mas será que eu preciso esperar até os oitenta anos para poder confiar no meu faro?
 
Não. Eu não levo a minha ironia até o ponto de ser tão cruel. É por isso que vou mostrar uma área em que você pode exercitar o seu faro sem cair numa imprudência excessiva. É o campo de atuação das relações humanas diretas, ou seja, das inúmeras circunstâncias em que, tendo um ou mais interlocutores à sua frente, você se pergunta qual é o melhor curso de ação a tomar.
 
Examinemos alguns casos concretos. Você está fazendo parte de uma conversa sobre assuntos gerais. Nestes comentários simples, nada parece dizer respeito ao seu êxito na vida. Você fala, você escuta e sorri como um bom rapaz que está distraindo-se, relaxando, se divertindo.
 
De repente, uma pessoa traz uma informação, apresenta uma ideia nova, dá uma opinião que ninguém compreende, mas que faz você aguçar os ouvidos. Uma evocação de ideias se forma em sua consciência. Seus pensamentos são subitamente orientados para possibilidades de ação, de ganho, de sucesso que você nunca havia pensado até agora. Algum dos amigos expressa preocupação com a “situação social atual”? Você sente imediatamente a onda de pessimismo que irá abalar a cidade ou a nação amanhã, e se pergunta que vantagens poderá tirar desta situação do ponto de vista dos seus negócios.
 
Em outra ocasião, é o anúncio de um casamento, de um nascimento, de um luto na família ou de uma “fofoca” sobre um desentendimento conjugal que irá “abrir perspectivas” para você. E não estou considerando apenas o caso em que você fica atento aos obituários na esperança de alugar imediatamente o apartamento do falecido. Na verdade, a dependência mútua dos homens é tão grande que qualquer acontecimento que afete um repercute, mais ou menos diretamente, nos outros. Quantos jovens tiveram a “sorte” de encontrar emprego porque a oportunidade de um encontro os alertou para uma vaga de emprego?
 
Cada indivíduo com quem você fala pode, portanto, tornar-se uma causa mais ou menos direta do seu sucesso. Se você tiver faro, descobrirá a conexão secreta entre essa pessoa e os seus futuros êxitos.
 
Com frequência o faro dá frutos de modo mais imediato. Você está, por exemplo, tentando convencer alguém de que deveria comprar algo de você ou vender-lhe alguma coisa? É importante que você conheça a intensidade do interesse que a sua oferta desperta. Sem dúvida, os números, as cotações, as tarifas, são excelentes meios de medição, mas será ainda mais útil o pressentimento sobre as “exigências” que pode fazer, sem que desapareça no seu parceiro a vontade de vender ou comprar.
 
Talvez um pequeno gesto, um ínfimo tremor das pálpebras faça você perceber um cansaço e uma intenção de abandonar o assunto. Seu faro o informou, e você modifica suas exigências.
 
4) Farejando o Perigo
 
Em outras circunstâncias, o faro age de maneira ainda mais misteriosa. Aquele indivíduo que vemos pela primeira vez provoca em nós a impressão de um perigo obscuro. Parece-nos que ao interagirmos com ele avançamos sobre um terreno movediço. Sentimos cheiro de deslealdade, de hipocrisia. Uma espécie de voz interior nos grita: “Atenção! Perigo!”
 
Este tipo de “aviso” pode ser apenas uma ilusão da imaginação, provocada por um medo exagerado. Mas se tivermos um faro relativamente experimentado, vamos congratular-nos muitas vezes por havermos obedecido a esses avisos.
 
É também pelo faro que você adivinha os ciúmes e as invejas latentes dos seus “amigos”, os ódios disfarçados sob sorrisos, as indiferenças camufladas de benevolência, as fraquezas dissimuladas pela aparência de força.
 
Como a fauna humana parece variada e patética, quando explorada pelo faro! Esse vaidoso que quer me deslumbrar com seu resplendor é, na verdade, apenas um “pobre coitado” que está tremendo cheio de inquietação. Posso adivinhar que aquele sujeito tão calmo, tão sensato, tão razoável, está agitado pelo frenesi do prazer, e está disposto a desperdiçar uma fortuna para satisfazer o seu apetite de prazer. Quanto a este outro, em cujo rosto há um sorriso fingido, sinto-o atormentado por arrependimentos, talvez por remorsos. Ele sofre e deseja fazer os outros sofrerem como forma de ter algum alívio.
 
Pelo jeito que o seu chefe o cumprimentou esta manhã você pode ter pensado: “Opa! Ele está de bom humor hoje. Talvez eu possa fazer a ele aquele pequeno pedido.”
 
Como vemos, a atividade do faro funciona a todo instante. É ela que provoca as nossas simpatias, nossas amizades, nossas repulsas, nossos ódios, as alegrias, as esperanças, as amarguras, e os arrependimentos em relação às pessoas que conhecemos e das quais dependem a nossa felicidade e a nossa vitória.
 
Reconheçamos também que o exercício do nosso faro nos coloca às vezes em situações em que não sabemos mais qual é o nosso dever. Por exemplo, você conhece uma pessoa que tem má sorte. Ao primeiro contato você a identifica e, em seguida, se você for um arrivista feroz ou um supersticioso, você pensa que o melhor é afastar-se deste indivíduo, este perdedor que tem “mau-olhado”. Talvez seja o momento de controlar de modo mais direto este julgamento instantâneo. Um faro mais aguçado mostrará a você que este azarado é “um bom sujeito”. Vale a pena ser solidário com ele, porque a sua gratidão pode ser preciosa no futuro.
 
5) O Faro Aplicado à “Situação Atual”
 
Quando o uso do faro visa perceber acontecimentos futuros que dependem da situação de curto prazo da economia, da política, das correntes de opinião nas comunidades, do estado atmosférico, das influências cósmicas, das ações especulativas na bolsa de valores, etc., as sugestões que ele nos dá têm uma credibilidade muito menor.
 
No entanto, também neste caso, o homem experiente pode, por falta de outros meios de tomada de decisão, deixar-se guiar pelo seu faro. Às perguntas que ele se faz: “Que obstáculos encontrarei provavelmente no meu caminho? Que apoio encontrarei para concretizar os meus planos?”, ele tem a possibilidade de responder eficazmente com suficiente aproximação, se o seu faro expressar uma filosofia de vida cuja base é realista.
 
Ter uma filosofia! Isso significa que adotamos o hábito de avaliar as pessoas, as coisas e os acontecimentos desde um determinado ponto de vista e guiados por princípios que decidimos aceitar de uma vez por todas como verdadeiros.
 
Você tem uma filosofia de vida se, por exemplo, acredita firmemente que o trabalho duro e a lealdade são os grandes fatores da vitória. Você tem outra filosofia muito diferente se imaginar que a fortuna pertence aos audaciosos e que é correto buscá-la através do jogo e do acaso. Nesta última situação, devo adverti-lo de que uma velha experiência humana, já confirmada inúmeras vezes, afirma que o faro do jogador com frequência o leva à ruína.
 
Portanto, esforce-se para preencher a sua mente com uma filosofia de vida cuja eficiência tenha sido comprovada pelos fatos. Se você tiver êxito, poderá chegar sem dificuldade a decisões espontâneas capazes de resolver os problemas que a vida lhe apresenta. Encontramos assim pessoas que conseguem estabelecer uma harmonia perfeita entre a capacidade profissional e a lealdade. O julgamento espontâneo delas é inspirado por esta combinação harmoniosa. Tais indivíduos são elogiados ao mesmo tempo por seu “faro admirável” e por sua “honradez indiscutível”. Estes são dois recursos valiosos para garantir a vitória!
 
6) A Cultura do Faro:
Sintonia com a Vitória
 
Que atitude mental você deve adotar, para desenvolver o seu faro e torná-lo mais aguçado?
 
Admitamos que os psicólogos ainda não conseguiram imaginar um método de treinamento do faro que seja tão eficiente quanto o usado pelos professores de ginástica para o crescimento da musculatura. No entanto, parece que a adaptação sutil e espontânea do nosso comportamento às condições necessárias para o êxito fica mais fácil quando a nossa mente se encontra num estado especial de expectativa que a torna capaz de “agarrar a oportunidade pelos cabelos”. [1]
 
O homem que tem faro, em geral, não é aquele que permanece inerte, contemplativo, passivo, sem desejos. Não, pelo contrário. Se você quiser cultivar o seu faro, mantenha sua mente em estado de alerta, de prontidão. Esteja atento à oportunidade favorável que vai passar. Melhor ainda, vá conhecê-la. Interesse-se pelas pessoas, pelas coisas, pelos acontecimentos, participe plenamente da vida social, integre-se à corrente da vida, incline suas antenas para todos os lados. Ouça, olhe, fareje. Em uma palavra, navegue na essência da realidade.
 
Naturalmente, isso significa que você será muito diferente das pessoas excessivamente formais, medrosas, desajeitadas, melindrosas e introvertidas, cuja principal preocupação é cortar os laços com os seus próximos, para manter suas almas delicadas longe de qualquer contato impuro. Ao contrário, você restabelecerá pontes, preencherá lacunas e multiplicará pontos de contato com o mundo exterior.
 
É claro que esta atitude de alma aberta também é incompatível com a postura da raiva crítica, que recusa qualquer comunhão e qualquer contentamento com os outros seres humanos, mas vê, em todo lugar, inimigos a serem combatidos.
 
Isso significa que você estará constantemente em busca de uma boa oportunidade e perguntando a si mesmo como pode tirar proveito das pessoas e das circunstâncias? Não. Este estado de espírito é rapidamente percebido por quem se aproxima de você – porque esta pessoa também tem faro -, e o torna antipático aos olhos de todos. “Ele é um ambicioso tremendo, só pensa em tirar vantagem”, dirão, e você provocará uma desconfiança terrível.   
 
A atitude de prontidão que torna o faro eficiente é uma tensão mais discreta na alma, de certo modo mais subterrânea, quase inconsciente.
 
Se fazemos um exame mais profundo, o faro aparece como a capacidade de formar espontaneamente uma noção daquilo que ganhará vida em breve. Eu digo “ganhará vida”. E isso é importante, porque estas palavras deixam claro que se trata de projetar-se ao futuro inteiramente e, por assim dizer, ligar-se ao acontecimento futuro, reunir-se com ele. Esta operação mental não é tão complicada quanto se poderia pensar. Já não aconteceu com você receber uma certa proposta diante da qual você respondeu, imediatamente e sem pensar: “Não, não. De jeito nenhum. Se eu aceitasse essa ideia, eu ficaria numa situação insustentável”.
 
Isso significa que você espontaneamente teve uma visão de si mesmo “numa situação insustentável”, vítima de preocupações e obstáculos de todo tipo. Esta imagem era um acontecimento vivido no futuro, ou seja, instalado no seu espírito com o calor e a cor da vida, e por isso despertou em você o impulso vital que chamamos de faro eficiente.
 
Quando aconselho você a estar num estado de expectativa e prontidão para agarrar a oportunidade pelos cabelos, falo de um certo estado emocional latente que eu convido você a conservar dentro de si, e graças ao qual o futuro pode reagir, influenciando o seu espírito.
 
Em outras palavras, o faro é a expressão de toda a sua personalidade, adaptada, instantaneamente, às circunstâncias futuras.
 
7) Algumas Receitas Práticas para
Garantir o Bom Funcionamento do Faro
 
Tome as suas decisões com o estômago vazio. Conforme afirma o ditado, “é a fome que faz o lobo sair da floresta”. O homem, também, quando está com o estômago vazio, sai do torpor, inventa, torna-se criativo e usa o seu faro. A pessoa saciada faz a digestão cochilando e não tem iniciativa. Se você estiver com um pouco de fome – não com muita fome – a ideia de conquistar o mundo parecerá emocionante. Sua mente estará alerta. Com que lucidez, então, você criará maneiras de alcançar a vitória!
 
Pense em quantas crianças de famílias pobres conquistaram de modo brilhante a fortuna, a glória, o conhecimento; na origem da genialidade delas está a fome. Por isso, desconfie das inclinações do seu faro, quando ele é exercido entre os momentos agradáveis de um bom café da manhã de negócios que alguém lhe oferece. Espere para comunicar os resultados a outras pessoas depois que você tiver feito a digestão.
 
Porém, não exagere no jejum. O faro não funciona bem quando estamos com pouca energia vital, ou sob a influência de um fracasso recente. A falta de ânimo e de força faz com que as antenas psíquicas funcionem precariamente, produzindo apenas sonhos quiméricos que servem de consolação.
 
Se este é o seu caso, tenha coragem de reconhecer que seu faro está funcionando mal. Trate de recuperar as suas energias. É assim que, contando com o seu conhecimento, com a sua experiência, a sua vontade de viver, você poderá, graças à força do instinto criativo, fazer com que surja uma imagem de futuro que é resplandecente de verdade e realismo.
 
O seu faro o levou a fazer uma besteira! Não se castigue inutilmente por isso, você apenas criaria um complexo de culpa e o resultado seria paralisar a sua autoconfiança.
 
Veja os fatos de maneira suficientemente filosófica para reconhecer que o faro – a intuição – é a aventura do pensamento. E nem todas as aventuras terminam bem. Aceite conviver com uma certa incerteza. A vida não pode avançar sempre como um teorema. 
 
8) Será Preciso Pensar no Pior?
 
Recebi a visita de um jovem que veio pedir conselhos sobre as chances de êxito que pode ter como artista.
 
O seu projeto o agradava infinitamente. Ser um artista famoso! Quem não sonhou, na juventude, com alcançar este ponto culminante! É muito mais agradável do que adotar como profissão um trabalho manual, mesmo que este seja extremamente lucrativo. Considerando que os pais ainda estão disponíveis e dispostos a garantir as despesas deste candidato à fama, ele deve aproveitar!
 
Acontece no entanto que os pais se cansam, e se perguntam se não seria oportuno pedir que o filho adote uma visão mais realista do problema de como sobreviver.
 
Esta era precisamente a questão psicológica do meu visitante. E, depois de examinar a situação, senti que era preciso apoiar a opinião dos pais.
 
– Você deve pensar, disse eu, no que vai acontecer se os seus projetos artísticos não se realizarem; e deve examinar que outra profissão gostaria de ter.
 
– Como é possível, gritou ele, que você me diga isso? Você, o grande estimulador da vontade! Se eu pensasse na renúncia, na possível derrota das minhas ambições, estabeleceria no meu interior o verme roedor da dúvida. Estaria preparando-me para a derrota. Não! Eu vou para a frente. Vou destruir todas as pontes atrás de mim. Não quero visualizar nenhuma possibilidade de recuo. Assim, eu me forçarei a vencer.
 
– Parabéns! Disse eu. Mas então você está pronto para enfrentar todo tipo de dificuldades durante muitos anos, talvez a vida inteira? Você terá coragem de aceitar a miséria sem reclamar? Você tem mesmo o temperamento de alguém que arrisca tudo alegremente, até mesmo sua vida?
 
E continuei no mesmo tom por muito tempo, porque sentia que era meu dever.
 
Realmente, em situações como esta, o fato de que um jovem não aceita pensar no pior é, com frequência, a prova de uma fraqueza fundamental da vontade. Acontece que ele não tem força para se libertar das suas ilusões, talvez produzidas secretamente por suas disposições orgânicas para a preguiça. Ele se recusa a encarar a realidade, porque isso o assusta. As hipóteses que perturbam a sua quimera o incomodam, e ele as descarta com um gesto infantil. É a política do avestruz, que esconde a cabeça na areia para não ver o perigo.
 
Tenho, portanto, a obrigação de repetir: a vontade verdadeira, consciente, razoável, é a vontade do general eficiente que tudo organiza para conquistar a vitória, que acredita apaixonadamente na vitória, que a anuncia como coisa certa às suas tropas, mas que, ao mesmo tempo, prevê todas as possibilidades, inclusive as piores, porque sabe que na guerra é necessário sempre curvar-se diante do deus do Acaso. Esta é a base de toda estratégia, e a base do comportamento na vida.
 
NOTA:
 
[1] Vemos neste parágrafo duas boas definições para a ideia de “vocação de vitória”, que é fundamental na teosofia autêntica. Em primeiro lugar, a vocação de vitória é “a adaptação sutil e espontânea do nosso comportamento às condições necessárias para o êxito”. Sem isso, a pessoa fica marcando passo sem avançar grande coisa. Por outro lado, a sintonia interior com o êxito provoca um “estado especial de expectativa que torna a mente capaz de ‘agarrar a oportunidade pelos cabelos’ ”. (CCA)
 
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O artigo “O Funcionamento do Faro” foi publicado nos websites da Loja Independente de Teosofistas em 29 de novembro de 2024. Trata-se de uma tradução do livro «Les Qualités Qui Font Réussir», de Jean des Vignes Rouges, Paris, Amiot Dumont, 1951, 223 pp., ver pp. 139-151. O artigo original está disponível online: “Le Rendement du Flair”. Tradução: CCA.
 
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Jean des Vignes Rouges é o pseudônimo literário usado pelo pensador e militar francês Jean Taboureau (1879-1970).
 
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Helena Blavatsky (foto) escreveu estas palavras: “Antes de desejar, faça por merecer”.
 
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