Pomba Mundo
 
Despertar do Discernimento Rompe a
Dominação Hipnótica da Mente Desatenta  
 
 
Robert Crosbie
 
 
o-poder-de-sugestao
 
Robert Crosbie (1849-1919)
 
 
 
Nota Editorial:
 
O texto a seguir foi publicado pela primeira vez na revista “Theosophy”, de Los Angeles, na sua edição de julho de 1922, pp. 252-262. [1] 
 
O processo de sugestão, individual ou coletiva, possui especial importância na primeira parte do século 21. As mentes de centenas de milhões de pessoas são hoje influenciadas pelo uso de técnicas subliminares de propaganda cujas mensagens centrais visam a escapar de todo exame racional e vão dirigidas principalmente ao subconsciente e ao inconsciente do cidadão. 
 
Conglomerados políticos, financeiros e econômicos têm o poder de moldar, dentro de certos limites, o comportamento de populações. Transmitem e registram nas mentes das pessoas sugestões que as levam, semi-hipnoticamente, a este ou aquele tipo de decisão pessoal, em obediência aos interesses de curto prazo de investidores de dinheiro movidos por ganância. George Orwell antecipou esta situação – levando-a a extremos pessimistas – em seu famoso livro “1984”.
 
O pessimismo não vê que nenhum mecanismo de manipulação mental é capaz de sustentar-se, porque seu alicerce é falso. Só a verdade permanece. Bastará o despertar de um determinado número de cidadãos para provocar um “efeito dominó” cujo resultado é o final do processo de manipulação das mentes e das emoções.
 
A Internet, embora em grande parte dominada pelas mesmas ilusões, oferece oportunidades para a produção e distribuição de real conhecimento, e de informação honesta. Livre de fronteiras, o mundo online abre espaço para a ajuda mútua e a cidadania mundial. São inúmeras as experiências em escala global nesta área inovadora, e a Wikipédia é apenas um exemplo. Ações solidárias e criativas aceleram a transferência gradual de poder desde as grandes burocracias – religiosas, científicas, comerciais e financeiras -, para o cidadão livre dotado de consciência e criatividade. O autorrespeito, o autoconhecimento e a autorresponsabilidade são os antídotos mais eficazes contra o veneno das sugestões hipnóticas.   
 
Helena Blavatsky previu um renascimento espiritual e uma vitória indiscutível da ética, durante o século 21. O despertar já começou, mas a nova primavera surge sem pressa. Ela é sobretudo uma transformação de consciências. O tempo necessário para que esta revolução se torne externamente visível pode ser maior ou menor. O aspecto cronológico externo não é importante. Vale o tempo interno. O despertar está surgindo de dentro para fora no plano da alma, e, assim como o nascer do sol, não pode ser atrasado ou adiantado através de ações artificiais. O texto de Robert Crosbie mostra com clareza o mecanismo da ignorância do qual é possível despertar. 
 
(Carlos Cardoso Aveline)
 
O Poder de Sugestão
 
Robert Crosbie
 
O poder de sugestão significa muitas coisas diferentes para diferentes pessoas. Está ligado à ideia de hipnose, um processo em que o operador é capaz de fazer um sujeito passivo pensar, dizer, fazer ou imaginar qualquer coisa que ele quiser. Isso é possível através da existência de certas condições anormais na consciência do sujeito passivo. Os meios e métodos pelos quais se induz a estas condições anormais não são conhecidos amplamente, embora alguns praticantes tenham desenvolvido várias maneiras de produzir processos hipnóticos.
 
Mas o que deve ser discutido é o fato da sugestão em si mesmo, em termos gerais, e também o modo como ele afeta os seres humanos. As pessoas não percebem que vivem quase inteiramente sob o efeito de sugestão. Desde o nosso nascimento somos rodeados por aqueles que sugerem certas ideias como verdadeiras, e seguimos as ideias sugeridas. Há em qualquer lugar muito pouco pensamento original, e isso é especialmente verdadeiro naqueles níveis que mais atraem a atenção do grande público, isto é, na política, na religião, e na ciência. Seja qual for o sistema de pensamento que nos é apresentado, nós o adotamos. Seguimos a sugestão dada, sem fazer uma tentativa de compreender a base daquilo que é sugerido. Os alicerces sobre os quais repousa a sugestão feita são aceitos automaticamente, mesmo nas coisas mais importantes da vida. 
 
Nossa religião, por exemplo, é apresentada como uma “revelação”. Nós a aceitamos na infância, e a aceitamos como um fato, sem examiná-la para ver o que é e em que se baseia. Nossos poderes de pensar e agir têm como origem uma sugestão inverdadeira. Isso não nos impede de pensar e agir, mas, como resultado deste início falso, todas as possibilidades de pensamento e ação, todas nossas criações mentais, toda a superestrutura da nossa existência, são falsas, porque, como pensamos sobre falsas premissas, nosso pensamento nos leva inevitavelmente a conclusões falsas.
 
Ocorre essencialmente o mesmo fato no caso do sujeito hipnotizado. Ele é lançado a uma condição anormal; ele não tem nada diante de sua mente; o hipnotizador apresenta uma determinada ideia e com ela a sugestão de certo tipo de ação. Imediatamente o hipnotizado adota a sugestão, passa a trabalhar a partir dela, e continuará a fazer isso até que a sugestão seja mudada.
 
Aqueles que nascem dentro de qualquer seita ou religião determinada deveriam saber disso. Com o nosso primeiro sentido de compreensão, ideias são apresentadas a nós e transmitidas às nossas mentes como fatos absolutos. Agimos a partir desta base, e por mais que sigamos longo tempo essas mesmas linhas, nenhuma conclusão ou compreensão verdadeira pode ser alcançada. O que sabemos do caráter verdadeiro ou falso das ideias apresentadas a nós na infância? Nada. O que sabem sobre elas os nossos pais e professores? Coisa alguma. Eles simplesmente passam para nós as sugestões que receberam na sua própria infância e que desde então operaram neles acumulativamente.
 
Devemos aprender a não aceitar afirmações, sejam elas feitas por quem forem, apenas porque são feitas para nós. Devemos examinar as bases de tudo o que nos é apresentado, e saber quais são os seus princípios, e se estes princípios são autoevidentes. Se eles não forem autoevidentes, como poderão ser básicos?
 
É comum a todos no mundo ocidental a ideia de que há um Criador deste universo. O que é que nós sabemos sobre isso? Se é verdade que um ser criou o universo e todos os seres que há nele, então nós não somos responsáveis. Como decorrência desta ideia, surgem outras: a ideia de que o ser humano só vive uma vez, de que esta é sua única encarnação, e de que não se pode saber para onde ele vai depois daqui. Seguimos a sugestão de que o ser humano vive uma só vida, de que ele é fundamentalmente irresponsável pelo fato de estar aqui, e construímos nossos pensamentos e nossas ações a partir desta base. Será que desta forma somos mais sábios, mais felizes, à medida que vivemos? Será que isso produz paz e felicidade para os outros? Isso faz com que cheguemos ao final da vida mais sábios e numa situação mais favorável? Sabemos que quando chegamos ao fim da vida devemos abandonar todas as coisas terrestres que tenhamos obtido enquanto estivemos aqui.
 
Mas esta Terra é apenas uma entre muitas Terras. O que dizer dos outros planetas, e dos outros sistemas solares presentes no espaço sideral? Temos algum conhecimento real em relação a eles ou à razão para que eles existam, com base na sugestão que nos foi passada?
 
Quando as nossas impressões religiosas são mudadas, quando outras sugestões nos são dadas, será que elas não nos são passadas do mesmo modo? Sejam quais forem – “ciência mental”, “novo pensamento”, “ciência cristã” e assim por diante – nós as adotamos, avançamos de acordo com as linhas de ação sugeridas, e então, o que é que nós realmente aprendemos? Nada. Chegamos ao final da vida igualmente presos à ignorância, apesar de todas as “revelações” que nos foram dadas. O que é que sabemos das bases destas revelações? Elas são verdadeiras, ou só parcialmente verdadeiras? Nunca alguém nos pede para examinarmos os pontos fundamentais e ver por nós mesmos se eles são verdadeiros e autoevidentes. Não. É solicitado de nós que aceitemos o que nos é dado e que trabalhemos a partir disso. Isso é sugestão.
 
A nossa vida municipal, nossa vida nacional e nossa vida política estão todas sob sugestão, e poucos são aqueles que tentam ir até a raiz das coisas e compreender qual é a natureza do ser, de modo a saber por si mesmos e assim agir com poder e conhecimento. Se olharmos ao nosso redor, veremos que todos sofremos a influência da sugestão em muitos aspectos.
 
Qual é o critério pelo qual podemos avaliar cada uma das sugestões apresentadas a nós? O critério é o seguinte: o que é verdadeiro explica o que antes era um mistério. E como estamos rodeados de mistérios, a Verdade deve explicar todos eles.
 
Este poder de sugestão ainda deve ser usado, seja qual for a linha assinalada para nós. Se a Verdade existe e podemos alcançá-la – a Verdade na religião, na ciência e na filosofia – ela deve vir primeiro até nós como sugestão desde Aqueles que sabem. Se isso não fosse possível, se não pudéssemos chegar à Verdade, então seria inútil falar sobre estas coisas. Mas quando o que é verdadeiro é sugerido a nós, há sempre um meio ao nosso alcance pelo qual podemos verificar o que é verdadeiro. Este meio não depende da autoridade ou da garantia de ninguém, mas consiste do fato de que podemos perceber a verdade e testá-la por nós mesmos. A autoridade final é o próprio ser humano
 
Um Deus externo é um ídolo. Devemos chegar até o mais íntimo do nosso próprio ser e compreender que é o nosso ser que escolhe e decide por si mesmo o que aceitaremos e o que rejeitaremos. O poder próprio da Divindade – o poder da escolha – está em cada um de nós. Quando começamos a compreender isso, alcançamos o primeiro indício da nossa própria imortalidade. Assim podemos ver que Aquilo que vive e pensa no homem é o Peregrino Eterno. Se você preferir usar o termo Deus, você pode dizer: “Há tantos Deuses no céu quantos seres humanos na terra.”
 
Há muitos seres abaixo do homem; talvez alguns admitam que pode haver, ou que há, seres maiores que o homem. Nenhum destes seres pode ser onipresente, nenhum deles pode ser Supremo. O que é aquilo que é onipresente e supremo em cada ser e todos os seres – no homem, nos seres abaixo do homem, e nos seres acima do homem? Será que não é este Poder de perceber, de pensar, de escolher, de agir a partir do pensamento e da escolha, a partir da Inteligência que o ser possui? Este Poder transcende todos os seres, e todas as concepções. É este Poder que está na raiz da evolução e constitui a própria Essência de cada ser. Ninguém está separado dele. Ninguém está destituído dele. Todos são raios dele e estão em unidade com ele. Não há possibilidade de qualquer existência separada dele.
 
O ser humano existe no meio de uma vasta evolução silenciosa, a evolução da Inteligência, da Alma. Todos os seres abaixo do homem devem subir a escada da existência até o nosso estágio, e quaisquer seres que existam acima do homem devem ter passado até além do nosso estágio, indo até mais alto na escada. Eles são nossos Irmãos Mais Velhos e viveram em civilizações anteriores às nossas – muitas eras antes da nossa e alcançaram um ponto de desenvolvimento muito acima do nosso.
 
Estes Irmãos Mais Velhos da família humana não são espíritos no sentido comum da palavra, nem são seres nebulosos, “deuses” ou “anjos”. Eles são homens, Mahatmas (“Grandes Almas”). São seres aperfeiçoados fisicamente, mentalmente, moralmente, psiquicamente e espiritualmente, que estão hoje onde nós um dia estaremos, quando nos tivermos aperfeiçoado do mesmo modo como eles, através de esforços planejados e desenvolvidos por nós mesmos.
 
Com Seu conhecimento e poder, com Sua capacidade de ajudar-nos e guiar-nos e com Seus esforços para fazê-lo, estes Mestres são para nós a maior e mais poderosa sugestão que poderia ser feita para qualquer ser humano. Eles estão dispostos a ajudar em qualquer tempo e lugar em que nós estivermos dispostos a receber a ajuda. Eles nunca pedem por coisa alguma; Eles estão sempre prontos para auxiliar aqueles que estejam dispostos a seguir as linhas indicadas, de modo que nós também, da nossa parte, possamos ser no futuro como Eles são – e possamos saber por nós mesmos.
 
Se aceitamos a filosofia dos Mestres tal como ela nos é dada em Teosofia, se a encararmos como uma teoria cujos méritos devem ser examinados, nós veremos que ela explica. Ela explica por que há tantos tipos diferentes de pessoas; ela explica as suas diferentes naturezas; ela explica por que alguns sofrem mais e outros sofrem menos. Ela explica por que um nasce em um lugar determinado, naquela família, naquele povo, naquela época. Ela explica cada uma das desigualdades que há na vida, cada injustiça, cada mistério. Ela capacita o ser humano para compreender a sua própria imortalidade para ter uma existência consciente no Espírito, mesmo enquanto está encarnado em um corpo aqui na Terra. Atualmente nós vivemos na matéria; pensamos que existimos na matéria e que dependemos da matéria para existir. Pensamos materialmente. Nossa religião é materialista, nossa ciência é materialista, e nossa filosofia é materialista. Tudo isso se deve ao mau uso do poder da sugestão e à nossa aceitação de ideias sem investigá-las, sem compará-las, e com base apenas nesta ou naquela autoridade. Nós acreditamos, mas não sabemos.
 
Não pode haver quaisquer Divindades, a menos que elas tenham surgido do Espírito Uno. Cada ser Divino é uma evolução. Onde quer que se fale de divindade, o tema é a evolução de um ser. Toda inteligência tem como base o poder de perceber, e este poder existe em cada graduação da escala da existência. A inteligência é o poder de conhecer. Esta ideia põe de lado grande número de sugestões das quais talvez nós tenhamos dependido. Seria correto não dependermos de nada exceto do nosso próprio poder inerente de aprender e de libertar-nos das nossas dificuldades. Todos os nossos poderes nasceram conosco; todas as nossas experiências passadas estão conosco, mas elas são afastadas de nós por um grande número de sugestões dadas a nós quando éramos crianças, e pelas falsas ideias que nós ainda alimentamos. Nada exceto a Verdade nos poderá jamais libertar, e cada um de nós pode descobrir e seguir a Verdade, e assim chegar a conhecer por si próprio.
 
NOTA:
 
[1] Trata-se do registro estenográfico de uma palestra de Robert Crosbie. “O Poder da Sugestão” (“The Power of Suggestion”) foi mais tarde incluído no volume “The Friendly Philosopher”, Robert Crosbie, Theosophy Co., Los Angeles, 416 pp., 1934-1946-2008, ver pp. 320-325. O artigo é aqui reproduzido da edição de dezembro de 2011 de “O Teosofista”.
 
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